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Mais de mil palhaços

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil,6 de setembro de 2007

Desculpem insistir no assunto, mas é preciso documentar o episódio antes que a passagem do tempo o torne retroativamente inacreditável.

O sr. Quartim de Moraes tornou-se o Rei dos Palhaços, ao mobilizar mais de mil foliões comunistas para defendê-lo contra uma “mentira deslavada” ( sic )… espalhada por ele mesmo. Querendo posar de herói da guerrilha perante uma platéia da Unicamp, alardeou que fora condenado à prisão pelo assassinato do capitão americano Charles Rodney Chandler em 1968. Quando repassei a informação a um público mais vasto, que poderia não ver o homicídio com bons olhos, mais que depressa o espertinho saiu choramingando que era tudo uma calúnia, que ele não havia sido condenado por isso, mas por algo de menos truculento.

Todos os Comitês Centrais disponíveis correram em auxílio da infeliz vítima da “mídia fascista”. Produziram a toque de caixa um “manifesto de intelectuais” (o gênero literário mais cultivado nesse meio), com apoio internacional e as assinaturas de mais de mil professores universitários, acusando-me, em português hediondo, de ser um joão ninguém sem força nenhuma e de ser um temível agente a soldo do imperialismo (você decide).

Como esses fulanos têm o dom de ficar valentes tão logo percebem que estão em mais de quinhentos contra um, o entusiasmo belicoso da patota foi crescendo com o número de adesões, multiplicando-se em ameaças apocalípticas: fazer em picadinho a minha reputação, botar-me na cadeia, o diabo.

Quando divulguei a fonte da informação, de repente a onda guerreira arrefeceu. O vozerio baixou, o inchaço de assinaturas parou de crescer, o manifesto sumiu das manchetes dos sites do PC do B e do PT, buscando discreto refúgio nas páginas internas.

É uma lástima. Quantas penas de amor perdidas, quanta vela queimada por um defunto chinfrim, para tudo acabar num punhado de cinzas varrido às pressas para baixo do tapete.

O autodesmentido do palhaço Quartim, camuflado de resposta indignada a acusações caluniosas, não melhora em nada a sua biografia real. Se ele não foi condenado como autor de homicídio, foi condenado como dirigente da entidade terrorista que constituiu ilegalmente o tribunal assassino e lhe deu força para executar sua sentença macabra. Organizações terroristas existem, por definição, para matar pessoas.

A desculpa de que foram forçadas à violência pela ditadura é porca e mentirosa como tudo o que sai da boca de comunistas. A guerrilha, iniciada em 1963 sob as ordens de Fidel Castro e a ajuda cúmplice do próprio João Goulart, não foi efeito do golpe de 1964: foi uma de suas causas. E os terroristas nunca lutaram pela democracia, e sim para instalar aqui uma ditadura igual àquela que as comandava, protegia e financiava, mil vezes mais cruel que a dos militares locais. Todos os comunistas sabem disso, e na intimidade riem dos tolos burgueses que acreditam na desculpa “democrática”.

Para mim, o manifesto serviu ao menos para recordar uma vez mais a extensão da rede de contatos internacionais do comunismo brasileiro — o Comintern sem nome, ativo hoje como nos tempos de Stálin, bons tempos segundo Quartim — e avaliar o volume de recursos de que essa gente dispõe para mobilizar contra qualquer inimigo isolado, pobre, e ainda chamá-lo de agente pago do capital. A desproporção seria cômica, se não tivesse, ao longo das décadas, ajudado os comunistas a matar mais gente do que todos os terremotos e epidemias do século XX, somados a duas guerras mundiais.

Promessa aos leitores

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 30 de agosto de 2007

Em entrevista ao Jornal da Unicamp, João Carlos Kfouri Quartim de Moraes, indagado sobre o atentado terrorista que matou o capitão americano Charles Chandler em 1968, respondeu: “Essa ação me valeu dois anos de condenação.” (v. aqui). Confiando nessa informação, repassei-a aos leitores do JB, e por isso fui acusado, pelo próprio Quartim, de publicar “uma mentira deslavada”. Em entrevista ao jornal eletrônico www.vermelho.org , reproduzida no site oficial do PT, o referido jura, agora, que não foi condenado por essa ação terrorista, mas por outro motivo. Não vou me perguntar se ele tem falta de memória ou falta de vergonha. Ambas essas deficiências aparecem sintetizadas na mentira esquecida, atribuída retroativamente a quem teve a imprudência de acreditar nela.

Ainda nas declarações à Unicamp, Quartim afirmou sobre o caso Chandler: “Boa parte dos indiciados morreu nos porões do Doi-Codi.”

Bem, da lista total de indiciados (publicada na Folha da Tarde de 28 de novembro de 1969), Carlos Marighela morreu em tiroteio de rua; Dulce de Souza foi trocada por um embaixador seqüestrado, viajou pelo mundo e voltou ao Brasil depois da anistia; Diógenes José Carvalho prosperou como presidente do Clube de Seguros da Cidadania e tornou-se tristemente célebre com o apelido de “Diógenes do PT”; João Leonardo da Silva Rocha foi para Cuba; Ladislau Dowbor continuou vivo, dando aulas na PUC de São Paulo; Onofre Pinto morreu em combate na fronteira com a Argentina, em 1974; Marcos Antonio Brás de Carvalho foi morto em tiroteio, na sua própria casa, em 1969; Pedro Lobo de Oliveira trabalhou como segurança do advogado Luís Eduardo Greenhalgh até pelo menos 1986, quando o vi pela última vez; João Carlos Kfouri Quartim de Moraes está vivo e, aparentemente, passa bem, pelo menos até ler este artigo. Só não sei de Manoelina de Barros, mas suspeito que ela também não “morreu nos porões do Doi-Codi”, pois seu nome não consta de nenhuma das listas de mortos e desaparecidos que circulam pela internet. Doravante – prometo aos leitores — darei a qualquer declaração de Quartim de Moraes a mesma quota de credibilidade que cabe à expressão “boa parte dos indiciados”.

Sugiro a mesma precaução aos militares brasileiros – poucos, espero – que aparentemente aceitam esse indivíduo como interlocutor confiável no “diálogo” que ele orquestrou entre as Forças Armadas e as organizações comunistas.

Afinal, esse diálogo – um novo nome para aquilo que antigamente se chamava infiltração — é composto de sorrisos e lisonjas, em público, mas entrecortado de ameaças veladas.

Às vezes a duplicidade não é só de palavras, mas de atos.

Matar prisioneiros inermes é um crime monstruoso em qualquer circunstância. Mas a liderança comunista tem-se esforçado para que aqueles que o cometeram sob as ordens do Estado brasileiro sejam objeto de castigo, enquanto os que fizeram o mesmo a mando de organizações terroristas são homegeados como heróis.

A última dessas homenagens glorificou a figura macabra de Carlos Lamarca – tão macabra quanto a de qualquer torturador do Doi-Codi –, que não só matou um prisioneiro amarrado, mas o fez em pessoa, com sucessivas coronhadas, esmagando-lhe metodicamente o crânio.

Naturalmente, esperar que crimes iguais tenham tratamento igual é extremismo de direita.

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