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Basta! Fora!

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 11 de junho de 2015

          

Volto a explicar, agora ponto por ponto, a catástrofe estratégica monstruosa com que o PT destruiu a si mesmo e à nação.
1. No incipiente capitalismo brasileiro, as grandes empresas são quase sempre sócias do Estado, o único cliente que pode remunerá-las à altura dos serviços que prestam.
2. Por isso elas acabam se incorporando ao “estamento burocrático” de que falava Raymundo Faoro: o círculo dos “donos do poder”, que fazem da burocracia estatal o instrumento dócil dos seus interesses grupais, em vez da máquina administrativa impessoal e científica que ela é nas democracias normais.
3. Nesse sentido, o sistema econômico brasileiro não é capitalista nem socialista, mas sim patrimonialista, como destacaram, além do próprio Faoro, vários estudiosos de orientação liberal, entre os quais Ricardo Velez Rodriguez, Antonio Paim e o embaixador J. O. de Meira Penna.
4. Nos anos 70 do século passado os intelectuais de esquerda que sonhavam em formar um grande partido de massas tomaram conhecimento do livro de Raymundo Faoro, Os Donos do Poder. Formação do Patronato Político Brasileiro, então lançado em aumentadíssima segunda edição, e entenderam que o curso normal da revolução brasileira não deveria ser propriamente anticapitalista, mas antipatrimonialista: o ponto focal do combate já não seria propriamente “o capitalismo”, e sim – com nomes variados — o “estamento burocrático”.
5. A definição do alvo era corretíssima, mas, ao mesmo tempo, o partido, como aliás toda a esquerda nacional, estava intoxicado de gramscismo e ansioso por tomar o poder por meio dos métodos do fundador do Partido Comunista Italiano, que preconizavam a infiltração generalizada e a “ocupação de espaços” destinadas a criar a “hegemonia”, isto é o controle do imaginário popular, da cultura, de modo a fazer do partido “o poder onipresente e invisível de um imperativo categórico, de um mandamento divino”.
6. A aplicação do esquema gramscista obteve mais sucesso no Brasil do que em qualquer outro país do mundo. Por volta dos anos 80, o modo comunopetista de pensar já havia se tornado tão habitual e quase natural entre as classes falantes no país, que os liberais e conservadores, inimigos potenciais dessa corrente, abdicaram de todo discurso próprio e, para se fazer entender, tinham de falar na linguagem do adversário, reforçando-lhe a hegemonia ideológica, mesmo quando obtinham sobre ele alguma modesta vitória eleitoral em troca. Entre os anos 90 e a década seguinte, toda política “de direita” havia desaparecido do cenário público, deixando o campo livre para a concorrência exclusiva entre frações da esquerda, separadas pela disputa de cargos apenas, sem nenhuma divergência séria no terreno ideológico ou mesmo estratégico.
7. O sucesso da operação produziu sem grandes dificuldades a vitória eleitoral de Lula numa eleição presidencial na qual, como ele próprio reconheceu, todos os candidatos eram de esquerda, o que canalizava os votos quase espontaneamente na direção daquele que personificasse o esquerdismo da maneira mais consagrada e mais típica.
8. Com Lula na Presidência, intensificou-se formidavelmente a “ocupação de espaços”, fortalecendo a hegemonia ao ponto de levar ao completo aparelhamento da máquina estatal pelo comando comunopetista, que ao mesmo tempo precisava da ajuda das grandes empresas para cumprir o compromisso assumido no Foro de São Paulo, coordenação estratégica da política comunista no continente, no sentido de amparar e salvar do naufrágio os regimes e movimentos comunistas moribundos espalhados por toda parte.
9. Inevitavelmente, assim, o próprio partido governante se transformou no “estamento burocrático” que ele havia jurado destruir. E, imbuído da fé cega nos altos propósitos que alegava, atribuiu-se em nome deles o direito de trapacear e roubar em escala incomparavelmente maior que a de todos os seus antecessores, sem admitir acima de si nenhuma autoridade moral à qual devesse prestar satisfações. O próprio sr. Lula expressou esse sentimento com candura admirável, afirmando-se o mais insuperavelmente honesto dos brasileiros, ao qual ninguém teria o direito de julgar – e isso no momento em que seu partido, abalado por uma tremenda sucessão de escândalos, já era conhecido no país todo como o partido-ladrão por excelência.
10. Assim, não apenas o PT fortaleceu o patrimonialismo, como frisou o cientista político Ricardo Velez Rodriguez, mas se transformou ele próprio na encarnação mais pura e aparentemente mais indestrutível do poder patrimonialista, soldando numa liga indissolúvel a ilimitada pretensão esquerdista ao monopólio da autoridade moral, os anseios do movimento comunista continental, os interesses de grandes grupos industriais e bancários, o aparato cultural amestrado (mídia, show business, universidades) e, last not least, o instinto de sobrevivência da classe política praticamente inteira.
11. Tal foi o resultado da síntese macabra que denominei faoro-gramscismo — a tentativa de realizar por meio da estratégia de Antonio Gramsci a revolução antipatrimonialista preconizada por Raymundo Faoro: na medida em que, ao mesmo tempo, instigava o ódio popular ao “estamento burocrático” e, por meio da “ocupação de espaços”, se transfigurava ele próprio no inimigo odiado, personificando-o com traços repugnantes aumentados até o nível do absurdo e do inimaginável, o PT acabou por atrair contra si próprio, em escala ampliada, a hostilidade justa e compreensível da população aos “donos do poder”, aos príncipes coroados do Estado cleptocrático.

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“NÓS ENCONTRAMOS O INIMIGO E ELE SOMOS NÓS”, DIZ O PERSONAGEM POGO, CRIADO POR WALT KELLY(1913-1973)
12. Ao longo do processo, a “ocupação de espaços” reduziu o sistema de ensino e o conjunto das instituições de cultura a instrumentos para a formação da militância e a repressão ao livre debate de ideias, destruindo implacavelmente a alta cultura no país e, na mesma medida, estupidificando a opinião pública para desarmar sua capacidade crítica. Ao mesmo tempo, no desejo de agradar a vários “movimentos de minorias” enxertados no Brasil por organismos internacionais, o governo petista fez tudo o que podia para desmantelar o sistema dos valores mais caros à maioria da população, contribuindo para espalhar a confusão moral, a anomia e a criminalidade, esta última particularmente favorecida por legislações que não se inspiravam propriamente em Antonio Gramsci, mas numa fonte mais remota do pensamento esquerdista, a apologia do Lumpenproletariat como classe revolucionária, muito em voga nos anos 60 do século XX.
O Brasil que o PT criou é feio, miserável, repugnante, tormentoso e absolutamente insustentável. Cumprida a sua missão histórica de encarnar, personificar e amplificar o mal que denunciava, o único partido da História que fomentou uma revolução contra si mesmo tem a obrigação de ser coerente e desaparecer do cenário o mais breve possível.
Por isso a mensagem que o povo lhe envia nas ruas, nos panelaços, nas vaias e nas sondagens de opinião é hoje a mesma que, em circunstâncias muito menos deprimentes e muito menos alarmantes, surpreendeu o desastrado e atônito presidente João Goulart em 1964:
– Basta! Fora!

Quando aprenderão?

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 3 de junho de 2015

          

Excetuadas algumas frustrações e desencantos banais que não vêm ao caso, só guardo uma única tristeza na alma: a de não sido ouvido numa época em que ainda havia tempo de bloquear a ascensão comunopetista e impedir que o Brasil mergulhasse no lodaçal em que vai afundando hoje em dia.
Não vai nisso o menor ressentimento pessoal. A indiferença à mensagem quase nunca implicou hostilidade ou desprezo ao mensageiro. Sempre fui muito bem recebido em toda parte. As pessoas me ouviam, aplaudiam e, com ares de amável ceticismo, prometiam pensar no assunto.
Ficaram pensando até agora. Nada fizeram.
Semana após semana os acontecimentos foram se avolumando exatamente como eu havia previsto, e ainda assim até os melhores entre os meus ouvintes continuaram acreditando que tudo passaria com o tempo, que nada de mau sucederia que não viesse a ser corrigido automaticamente pela mágica do mero rodízio eleitoral.
Isso era impossível, protestava eu. Onze anos atrás escrevi:
“Quem quer que, a esta altura, ainda sonhe em ‘vencer o PT’, seja nas próximas eleições, seja ao longo das décadas vindouras, deve ser considerado in limine um bobão incurável, indigno de atenção.
“O PT, como digo há anos, não veio para alternar-se no poder com outros partidos — muito menos com os da ‘direita’ — segundo o rodízio normal do sistema constitucional-democrático. Ele veio para destruir esse sistema, para soterrá-lo para sempre nas brumas do passado, trocando-o por algo que os próprios petistas não sabem muito bem o que há de ser, mas a respeito do qual têm uma certeza: seja o que for, será definitivo e irrevogável.
“Não haverá retorno. O Brasil em que vivemos é, já, o ‘novo Brasil’ prometido pelo PT, e não tem a menor perspectiva de virar outra coisa a médio ou longo prazo, exceto se forçado a isso pela vontade divina ou por mudanças imprevisíveis do quadro internacional.”
Continuava:
“É deplorável ter de insistir numa coisa tão evidente, mas uma estratégia de escala continental, escorada numa rede global de organizações e no completo domínio da atmosfera cultural não pode ser enfrentada por meio de resistências locais, de espertezas provincianas, de críticas pontuais a erros econômico-administrativos ou da aposta louca nas brigas internas da facção dominante, que só a revigoram. A desproporção de forças, aí, é tão brutal, tão avassaladora, que não vale nem mais a pena insistir no assunto.”
Isso foi em 2004 (leia aqui).
Hoje até as crianças sabem que o establishment brasileiro – a administração pública, três quartos do Congresso, o STF, o sistema judiciário praticamente inteiro, a justiça eleitoral, a educação desde o primário até a universidade, a CNBB, parte considerável da “grande mídia” e um punhado de mega-empresas – se reduziu a uma máquina dócil e bem azeitada para amparar as tramas do PT, assessorar e acobertar os seus crimes, ajudá-lo na realização dos planos do Foro de São Paulo e na instauração da Pátria Grande comunista dos sonhos dos irmãos Castro e de Nicolás Maduro.
Chegamos finalmente a uma situação em que mesmo dois milhões de brasileiros clamando nas ruas, multidões xingando Lula e Dilma por toda parte e 90% da população exigindo nas pesquisas de opinião o fim do império petista são impotentes para remover de seus postos os delinquentes que se apossaram do país e dele fizeram um bordel de luxo para os poucos, um favelão para os demais.
Na melhor das hipóteses, ela mesma remota e dificultosa, conseguirão obter do Congresso, como prêmio de consolação pela legitimação de eleições notoriamente fraudulentas, um miserável impeachment presidencial, medida simbólica que bem pode deixar intacto o restante do sistema comunocleptocrático instalado em Brasília.
Quer isso dizer que minhas previsões de 2004 fossem proféticas? Que nada. Estavam é atrasadíssimas. Em 1993, no livro A Nova Era e a Revolução Cultural, eu já havia exposto o plano praticamente inteiro do PT para a dominação do país. O livro não foi ignorado. Vendeu uma edição inteira no dia do lançamento, outra nas semanas seguintes. A terceira esgotou-se, a quarta (Vide Editorial, 2014) já está no fim. Foi lido e guardado na estante, bem longe da possibilidade de inspirar qualquer ação, mesmo tímida.
Em 1989, em conferência na Casa do Estudante no Brasil, sob o título “O fim do ciclo nacionalista”, eu já equacionava o drama de um país cuja cultura se formara sob o signo do nacionalismo e da busca da identidade (o “senso da nacionalidade” de que falava Machado de Assis) e ao qual coubera o destino infeliz de começar a projetar-se no cenário do mundo justamente numa época em que a tendência geral é dissolver as soberanias nacionais e absorvê-las em conglomerados regionais que vão tentando aplanar o caminho para a ambição utópica mas persistente de um governo mundial.
Ao ver hoje a marcha triunfante da Pátria Grande, que o povo odeia mas da qual não sabe como se livrar, pergunto-me por que, de tantos intelectuais, políticos e militares que me ouviram na ocasião (pois repeti a conferência em vários lugares), nenhum entendeu que, naquele momento, a inventividade, a audácia criadora, em vez da acomodação preguiçosa no culto beócio da “estabilidade das nossas instituições”, eram uma questão de sobrevivência, não de livre escolha?
Por que tantas pessoas aparentemente inteligentes, em vez de vasculhar os livros e documentos a que eu me referia, preferiram crer na lenga-lenga anestésica da TV Globo e da Folha, para cujos porta-vozes eu era apenas um alarmista histérico, um “saudosista da Guerra Fria”, ou, como disse textualmente o sr. Otavio Frias Filho, um açoitador de cavalos mortos?
Quem, hoje, exceto o alucinado Marco Antonio Villa, que ama tanto a chacota que a atrai toda para si, seria ainda louco de negar que praticamente tudo o que expliquei e previ ao longo dos anos era no mínimo o que havia de mais próximo à verdade, enquanto em volta os luminares, os bem-pensantes, os senhores doutores, os consultores pagos a peso de ouro, só repetiam chavões soporíferos tipo “Lula mudou”, “o socialismo morreu”, “as nossas instituições são sólidas” etc. etc.?
Aos poucos, porém, fui notando que as mudanças históricas que eu descrevia — e que as inteligências mais vigorosas da platéia não negavam, mas nas quais nada viam além de uma caminhada brilhante em direção a “mais democracia” – traziam, em si mesmas, a causa da incompreensão com que minhas palavras eram recebidas.
Comecei a documentar esse aspecto do processo em O Imbecil Coletivo, de 1995: estrangulada pela “ocupação de espaços” gramsciana, onde o critério do prestígio intelectual e artístico passava a ser uma carteirinha do PT ou do PSOL, a alta cultura no Brasil agonizava.
As inteligências definhavam a olhos vistos, tornando impossível um debate sério sobre o que quer que fosse e substituindo tudo por uma linguagem de clichês na qual nada se podia dizer que já não tivesse sido dito mil vezes.
A juventude, nascida já no meio da debacle, não podia ver nela nada de anormal, por lhe faltar a escala comparativa. Acomodava-se à degradação confortavelmente, prazerosamente, embriagada pela promessa de deleites sensuais espetaculares sob a proteção do Estado-babá.
Mas, para quem tinha sido criado na época em que os debates culturais e políticos eram conduzidos por leões como um Otto Maria Carpeaux, um Álvaro Lins, um Nicolas Boer, um Julio de Mesquita Filho, um Antônio Olinto, um Mário Ferreira dos Santos, um Vilem Flusser, ver de repente o cenário intelectual ocupado inteiramente por micos-leões-dourados tipo Emir Sader, Marilena Chauí, Renato Janine Ribeiro, Vladimir Safatle, Gilberto Felisberto de Vasconcelos, Luís Fernando Veríssimo e tutti quanti era algo que prenunciava, para esta parte do mundo, uma idade das trevas.
Analisado à luz da regra de Hugo von Hoffmanstal, de que “nada está na política de um país que não esteja primeiro na sua literatura”, o Brasil do futuro que se vislumbrava nos debates públicos dos anos 90 era exatamente o que temos hoje: um vácuo sangrento, um Nada crescente e invencível que tudo devora.
Documentei o fenômeno em linguagem satírica, que a evolução posterior dos acontecimentos veio a tornar inadequada à medida que o ridículo e o grotesco, passando da esfera das idéias à dos atos e das leis, afirmaram o poder da sua autoridade incontrastável e se consolidaram nas formas monstruosas do deprimente, do abjeto, do indescritivelmente vergonhoso. Daquilo que não pode ser satirizado porque, como diria Karl Kraus, já ultrapassou as fronteiras da sátira.
Não posso repassar mentalmente esse trajeto sem que me volte à memória o  refrão de uma velha canção folclórica americana: “Oh, when will they ever learn?”

Gerenciando os danos

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 26 de maio de 2015

          

No último programa da Joice Hasselmann, o sr. Marco Antonio Villa, sem citar o meu nome, já que não é homem para isso, voltou a chamar-me de “embusteiro”, “171” e coisas similares, desta vez por ter atribuído ao dramaturgo comunista Bertolt Brecht a seguinte frase, dita a propósito dos condenados nos Processos de Moscou: “Se eram inocentes, tanto mais mereciam ser fuzilados.”
Brecht, segundo Villa, jamais disse isso.
É tudo invenção minha. Infelizmente, o episódio é testemunhado pelo filósofo Sidney Hook na página 493 do seu livro de Memórias, Out of Step. An Unquiet Life in the 20th. Century (New York, Carrol& Graf, 1987) e, segundo Paul Johnson – em Intellectuals, página 190 da edição de 2007 da Harper Perennial (agradeço ao Filipe G. Martins este lembrete) –, foi confirmado por outra testemunha, o prof. Henry Patcher, da City University.leia
O leitor pode verificar por si mesmo nas imagens que acompanham este artigo.
Novamente fica esclarecido quem é o embusteiro.
Mas o embuste do qual o sr. Villa fez a sua especialidade profissional não teria maior relevância se consistisse apenas em mentir contra alguém do qual ele sabe praticamente nada e que nunca lhe fez mal nenhum.
Birras individuais sem motivo, mesmo quando levam a obsessões difamatórias, são matéria para consultórios de psicoterapia, não para discussão pública.

leia
Mas o anti-olavismo espumante do sr. Villa não é uma loucura sem método. Há nele toda a racionalidade perversa de uma estratégia política calculada para montar na onda da revolta popular antipetista e, esvaziando-a de todo conteúdo ideológico, revertê-la no fim das contas em benefício da mesma “revolução gramsciana” que criou o PT, o instaurou no poder e o dotou de todos os meios de mentir, trapacear e roubar sem jamais ser punido.
Muito antes de que o sr. Villa entrasse em cena, eu já havia mostrado essa estratégia em ação no Brasil (leia aqui e aqui).
Trata-se do velho artifício esquerdista de limpar-se na sua própria sujeira. Quando crimes e iniquidades longamente negados e explicados como invencionices da “imprensa burguesa” crescem ao ponto de se tornar impossível escondê-los, a esquerda rouba de seus adversários o discurso de denúncia, num esforço tardio e desesperado, mas não raro bem-sucedido, de saltar do banco dos réus para a tribuna dos acusadores.
O procedimento retórico empregado nessa operação é sempre o mesmo: reconhecer os delitos, mas atribuir sua culpa à “direita”, passando a chamar retroativamente de direitistas os mesmos líderes que durante décadas a esquerda em peso reconhecera como as personificações quintessenciais do mais puro esquerdismo.
Se fizeram isso até com Stálin – e, na França de 1968, com o Partido Comunista inteiro – por que não haveriam de fazê-lo também com Lula, na hora do aperto?
Se já esboçaram reações desse tipo em 2004 e 2006, quando os escândalos eram ainda incipientes, por que não haveriam de reencená-las, com mais ênfase ainda, no momento em que os feitos do PT se revelam, aos olhos do povo, como recordes mundiais de corrupção dignos de figurar no Guiness?
Para desempenhar sua parte no empreendimento, o sr. Villa faz das tripas coração para persuadir a plateia a engolir duas mentirinhas bobas nas quais nem ele mesmo acredita:
Primeira: Nem Lula nem o PT têm nada de comunistas. Lula não passa de um direitista empenhado em defender o grande capital.
Segunda: Só quem pode e deve fazer algo contra o descalabro petista são as “nossas instituições democráticas”: o Congresso e o sistema judiciário. As massas que tratem de refrear seus impulsos belicosos e de obedecer a seus “legítimos representantes”. Tudo o que vá além desse limite é “saudosismo da ditadura”.
Comentarei aqui só a primeira delas, deixando a segunda para um artigo vindouro.
Com o objetivo de sustentar a tese do direitismo petista o comentarista tem de estreitar propositadamente o seu horizonte de visão até que nada caiba nele além de um “esquema de corrupção” do qual se beneficiam, junto com o PT, alguns grandes grupos bancários e empresariais. Para fazer disso um “direitismo” é preciso operar no corpo da realidade alguns cortes drásticos, suprimindo:
(a) o fato de que o esquema tem financiado o crescimento das organizações de esquerda até o ponto em que só elas, e mais partido nenhum, podem apresentar candidatos à presidência;
(b) o fato de que as verbas do Estado brasileiro têm sido usadas generosamente para salvar o movimento comunista na América Latina e na África, injetando vida nova em regimes ditatoriais economicamente moribundos;
(c) o fato de que essas mesmas verbas alimentam o crescimento da “revolução cultural” gramsciana em todas as áreas da vida social, promovendo sistematicamente a derrubada dos valores que na perspectiva gramsciana representam a “ideologia burguesa”;
(d) o fato de que o dinheiro público fomenta o crescimento ilimitado de “movimentos sociais” criminosos, cada vez mais reconhecidos como entidades imunes à aplicação das leis.
E por aí vai. As vantagens financeiras que alguns banqueiros e empresários têm levado nesse esquema não são nada mais que as migalhas que o próprio Lênin recomendava atirar a uma burguesia idiota o bastante para abdicar de todo poder político próprio – e até de um discurso ideológico próprio – em troca de um dinheiro sujo que só serve para escravizá-la cada vez mais à liderança esquerdista.
É só suprimir esses fatos, e pronto: transferida a patifaria lulista para a “direita”, o público está preparado para contentar-se com um antipetismo higienizado, castrado, apolítico, incapaz de trazer qualquer dano às organizações de esquerda, mas bem capaz de salvá-las do desastre que elas mesmas criaram.
Tal é o antipetismo do sr. Villa e de outros iguais a ele: puro gerenciamento de danos.

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