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O lobo de sabonete

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 29 de julho de 2013

          

O sr. Mauro Santayana, escrevendo na Carta Maior do dia 14, não vem com choradeiras: esbraveja, ameaça, pede prisão para toda uma categoria de indivíduos que ele rotula genericamente de “hitlernautas”, mas dos quais não cita um nome sequer nem fonte onde se possa encontrá-los.
Pelo artigo entende-se, no máximo, que fizeram uma passeata e escrevem contra o Foro de São Paulo nas suas páginas da internet.
Os “hitlernautas”, segundo ele, são todos uns belos neonazistas, e seus websites constituem “o espelho de certas organizações fascistas internacionais” (sic), das quais ele também não cita nenhuma.
Investindo contra alvos tão indefinidos, o sr. Santayana está livre para acusá-los do que bem entenda e até para lhes imputar crimes cometidos sete décadas atrás, quando eles ainda não haviam nascido e a internet não existia: “Sob seus olhos frios, seus gritos carregados de ódio, milhões de inocentes foram torturados, levados às câmaras de gás, e incinerados, em Auschwitz, Maidanek, Birkenau, Dachau, Sachsenhausen – e em dezenas de outros campos de extermínio montados por ordem de Hitler.
Os hitlernautas não devem ser subestimados.”
Ele pode, é claro, alegar que não quis dizer isso, que apenas fez um paralelo histórico. Mas a concatenação das frases é calculada para injetar na mente do leitor uma conclusão pela qual o sr. Santayana, se espremido contra a parede, poderá em seguida se isentar de toda responsabilidade. Digo mesmo que isso é um dos traços característicos da sua maneira de escrever. Por exemplo: a palavra “espelho”. Quer ela dizer que as páginas acusadas apenas se parecem, na imaginação do sr. Santayana, com as de “certas organizações fascistas internacionais”, ou que seus autores têm alguma ligação com essas entidades? É quase impossível que o leitor, se tem algum respeito pelo sr. Santayana, não aposte nesta segunda hipótese. Mas o próprio articulista, se alguém lhe exigir as provas que ele evidentemente não tem, será o primeiro a alegar que só quis insinuar uma vaga semelhança, sem acusar ninguém de coisa mais substantiva. O estilo é o homem: o sr. Santayana parece um lobo feroz, mas é um lobo esculpido em sabonete, pronto a escorregar, diluir-se e desaparecer ao primeiro sinal de perigo.
Para não dizer que tudo no seu artigo é insinuação vaga, ele informa que os referidos saem de casa levando coquetéis Molotov (um hábito notoriamente direitista, como se vê pelo nome), jogam pedras na polícia, quebram prédios públicos, saqueiam lojas e põem fogo em carros da imprensa.
Em vista de tão nefandos crimes, conclui o articulista: “Cabe ao Ministério Público, com a ajuda da Polícia Federal, identificá-los e denunciá-los à Justiça, para que sejam julgados e punidos, em defesa da democracia.”
Se ele permanece mudo quanto aos nomes dos acusados, não é porque não os conheça: é porque sabe que entre os agitadores infiltrados na massa de manifestantes e responsáveis pelo atos acima referidos não há um único “direitista”, seja isto lá o que for – só militantes de partidos de esquerda e funcionários da Presidência da República. O silêncio, pelo menos nessas horas, é mesmo de ouro.
Eu, porém, que não sou pago para defender uma agenda específica e sim para escrever livremente o que bem deseje, posso tranqüilamente citar algumas fontes onde o leitor encontrará os nomes e os fatos que o sr. Santayana lhe sonega:

· http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/06/1295714-servico-secreto-da-pm-diz-que-psol-recruta-punks-para-protestos.shtml

· http://globotv.globo.com/globo-news/jornal-das-dez/v/policia-identifica-suspeitos-de-liderar-manifestacao-de-sexta-feira-14-em-brasilia/2640187/

· http://blogs.estadao.com.br/selecao-universitaria/politicos-pagam-fianca-de-manifestantes-presos-em-fortaleza/

· http://jornaldehoje.com.br/filho-do-vereador-marcos-do-psol-e-detido-com-coquetel-molotov-diz-pm/

Viram quem saiu às ruas levando um coquetel Molotov? Viram quem contratou e pagou punks para destruir prédios públicos, bater na polícia, etc.? Viram quem apadrinha e protege os vândalos? Entendem por que o sr. Santayana não pode apontar nomes e fatos, apenas escondê-los e achincalhar a multidão genérica dos inocentes sob o rótulo fácil e boboca de “hitlernautas”?
O apelo hipócrita à retórica antinazista como escudo de proteção é aliás um dos traços mais velhos e inconfundíveis da desinformação comunista. E não uso a palavra “desinformação” como um vago insulto, como o fazem os próprios comunistas (o sr. Valter Pomar, por exemplo). Uso-a no sentido técnico e estrito da palavra, para designar operações de engodo estratégico como aquela montada pelo governo soviético nos anos 30: alimentar e fortalecer o poder nazista para jogá-lo contra as potências ocidentais e depois posar de defensor do mundo contra o “flagelo nazista”. A coisa foi um sucesso: deu a Stálin o domínio sobre meia Europa e ainda forneceu a gerações de mentirosos profissionais comunistas um chavão de fácil manejo e uso praticamente ilimitado: chame o adversário de nazista e instantaneamente ele parecerá culpado de tudo o que os comunistas fazem. E o emprego desse ardil não foi só literário: para dar-lhe mais credibilidade, a Stasi, polícia secreta da Alemanha Oriental comunista, criou, subsidiou e espalhou na Alemanha Ocidental dezenas de organizações neonazistas para fins de diversionismo e camuflagem. Com a unificação das Alemanhas, o “neonazismo”, é claro, definhou um bocado.

A técnica da rotulação inversa – II

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 27 de janeiro de 2011

Miguel Nicolellis é professor de neurociências na Duke University (EUA), fundador do Instituto de Neurociências Edmond e Lilly Safra (Macaíba, RN) e membro das Academias de Ciências do Brasil e da França. A esse currículo notável acrescentou-se recentemente sua nomeação, pelo Papa Bento XVI, para a Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano. O site Viomundo, do jornalista Luiz Carlos Azenha, apresenta-o agora em formato ainda mais atraente: o cientista seria vítima indefesa de uma vasta campanha de ódio e intimidação movida pela sempre abominável “extrema direita”.

Chocado e amedrontado ante a virulência assassina da campanha, o prof. Nicolellis, no tom de bom-mocismo que deve caracterizá-lo como um adepto incondicional do debate livre e democrático, alerta para os perigos da radicalização ideológica:

“O seu adversário político, ideológico, passa a ser o seu inimigo. E esse inimigo é passível de qualquer tipo de punição, até mesmo a morte. Eu não consigo imaginar que essas pessoas que propagam mensagens de ódio, vingança, violência, podem ao mesmo tempo se dizer cristãs.”

Mas em que consistiu, afinal, a mortífera campanha? Consistiu em duas coisas: Primeiro, uma notícia de dez linhas, publicada no site Rorate Coeli em 5 de janeiro (v. http://rorate-caeli.blogspot.com/2011/01/pope-names-pro-abortion-and-pro-gay.html), dando ciência de que o Prof. Nicolellis era um ardente defensor do abortismo e das políticas gayzistas (bem como, no ano passado, da candidatura Dilma Rousseff), sendo portanto um pouco estranha a sua presença numa instituição vinculada à Igreja Católica. Depois, um (1,hum) artigo escrito pelo jornalista americano Matthew Cullinan Hoffman, publicado no site Last Days Watchman (v. http://www.lifesitenews.com/news/defender-of-pro-abortion-and-homosexualist-policies-appointed-to-vaticans-a) e depois reproduzido com ou sem acréscimos e comentários nuns poucos sites cristãos, entre os quais a versão brasileira de Lifesitenews, Notícias Pró-Família, dirigida pelo escritor brasileiro Júlio Severo (voltarei a falar dele mais adiante). Hoffman, que é católico, comentava: “O Papa Benedito XVI é um inflexível defensor do direito à vida e dos valores da família, sendo improvável que ele estivesse ciente da biografia de Nicolellis ao indicá-lo para a Academia.”

Houve qualquer ameaça, qualquer esboço de planos agressivos? O prof. Nicolellis confessa: Não, não houve.

Contra aquelas expressões de discordância perfeitamente inofensiva, como reagiu o Prof. Nicolellis? Debatendo com os adversários? Que nada. Ele próprio descreve os seus procedimentos argumentativos:

“O pessoal do meu laboratório contatou a Duke, alertou sobre esses sites e a polícia da universidadade já começou a monitorar o caso. A segurança do meu laboratório foi reforçada… Ninguém chega lá sem passar pela segurança.”

E adverte: ao primeiro sinal de ameaça no Brasil, chamará imediatamente a Polícia Federal.

Dentre os potenciais agressores do prof. Nicolellis denunciados pelo site Viomundo, um dos principais já está sob controle. Júlio Severo, procurado pela polícia brasileira pelo crime hediondo de ter dito e insistido que o homossexualismo é pecado e tem cura, está escondido no exterior, trocando de país como quem troca de cuecas, vivendo em extrema penúria com mulher e quatro filhos pequenos. O repórter Luiz Carlos Azenha menciona esse fato com evidente satisfação. Celebra-o também, como sinal dos progressos da democracia no Brasil, o site Fórum, do colunista Luís Nassif (http://blogln.ning.com/forum/topics/homofobia-em-preto-e-branco?page=1&commentId=2189391%3AComment%3A502681&x=1#2189391Comment502681).

As premissas lógicas embutidas nas declarações do Prof. Nicolellis e nas reportagens dos sites Viomundo e Fórum não poderiam ser mais evidentes:

1) Dizer qualquer palavra contra o homossexualismo, mesmo de maneira genérica e desacompanhada de qualquer ameaça, é incitação à violência, coisa indigna de pessoas que se dizem cristãs.

2) Um cidadão esclarecido, amante do debate livre e democrático, deve reagir a essas opiniões exibindo-se em público como vítima iminente de atentado, chamando a polícia e fazendo com que os desgraçados opinadores sejam perseguidos como bandidos, acossados como ratos.

A reação brutalmente exagerada, espera-se, induzirá o distinto publico a acreditar piamente que violentos são aqueles que emitiram as opiniões, não aqueles que mobilizaram contra eles a força armada do aparato repressor.

Se o leitor queria uma ilustração local do que escrevi sobre a técnica da rotulação inversa, aí está.

O emprego constante e obsessivo dessa técnica é uma das manifestações mais corriqueiras da inversão geral da realidade, característica da mentalidade revolucionária.

Não por coincidência, mas muito significativamente, o prof. Nicolellis, algum tempo atrás, andou esbravejando contra a “direita histérica”. Histeria, por definição, é reação hiperbólica a algum estímulo imaginário e postiço. Quando o prof. Nicolellis reage histericamente, histéricos são portanto os outros.

Notícias esotéricas

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 25 de maio de 2006

Os órgãos brasileiros de mídia são notavelmente uniformes não só no que publicam, mas também no que omitem. Se você quer saber algo sobre as passeatas anti-Lula do último dia 23, que em São Paulo reuniram dezenas de milhares de participantes, trate de vasculhar a internet, por exemplo o site http://www.agenciaeletronica.net/aenova/destaque_foto.cfm?cod=39. Nem uma única palavra a respeito foi dita, nem uma fotografia foi mostrada nos jornais e noticiários de TV, embora essas passeatas, sendo após quarenta anos a primeira manifestação de massas não promovida por organizações de esquerda, constituíssem acontecimento histórico de importância excepcional.

Quando protesta contra as tentativas governamentais de controlá-la, a mídia nacional não o faz por amor à liberdade, mas por ciúme. Julgando-se, no fundo, uma peça integrante da hierarquia estatal, ela não pode aceitar que outro setor da burocracia dispute o seu monopólio do poder de censura. Quem, afinal, decidiu que os jornais brasileiros jamais noticiariam as matanças de cristãos na China e no Vietnã? Foi o governo? Não. Foram os próprios jornalistas brasileiros, que podem às vezes se irritar com este ou aquele político de esquerda, mas, no geral, permanecem fiéis à solidariedade internacional do movimento comunista que os educou e determinou sua forma mentis. Quem foi que proibiu qualquer menção às torturas e assassinatos de presos políticos na Guantanamo cubana, para dar verossimilhança à impressão de que o vizinho hotel de cinco estrelas construído pelos EUA para abrigar terroristas é uma câmara de horrores? Quem omite assepticamente qualquer informação sobre o governo mundial em acelerado processo de formação na ONU e seu apoio bilionário às organizações subversivas, mantendo assim a opinião pública na crença idiota de que o perigo de morte para as soberanias nacionais provém do bom e velho “imperialismo americano”? Quem proíbe qualquer notícia sobre o Foro de São Paulo e a articulação sistêmica dos partidos de esquerda com gangues de narcotraficantes e seqüestradores, sustentando a ilusão geral de que a ascensão da criminalidade no Brasil é fruto espontâneo da “miséria”, da “exploração capitalista” e até do “racismo policial”?

Quem recorta e deforma a esse ponto a realidade, mantendo a população brasileira anestesiada, estupidificada, enclausurada numa redoma de erros e fantasias, não é o governo, não é a Polícia Federal, não é o PT. É o próprio esquerdismo atávico da classe jornalística, que prefere antes furar os próprios olhos, num ritual macabro de auto-sacrifício masoquista, do que enxergar o cenário de tragédia que sua cumplicidade acomodada e covarde está ajudando o neocomunismo a construir na América Latina. Tão profunda e arraigada é sua devoção à fé esquerdista, que, ao perceber algum burocrata tentando controlá-la de fora, ela se sente humilhada e insultada como a esposa fiel que vê o marido ciumento instalar grampos de telefone para precaver-se contra amantes imaginários.

É claro que, de vez em quando, verdades indesejadas furam o bloqueio. Isso só acontece quando são alardeadas primeiro no Parlamento, tornando-se impossíveis de esconder por completo. E, também é claro, só explodem no Parlamento as más notícias que podem ser reaproveitadas como elementos de uma crítica esquerdista ao petismo triunfante ou neutralizadas como denúncias puramente moralísticas, expurgadas de toda substância ideológica. Questionar, no conjunto, a suprema autoridade moral do esquerdismo uspiano (ou tucanopetista) que nos domina há duas décadas, ah, isso não. É preciso, a todo preço, manter o debate político dentro dos limites do “centalismo democrático”, só cedendo o microfone às vozes previamente autorizadas e dando a impressão de que as demais não existem. Se para isso é preciso tornar a realidade inteira um segredo esotérico, só acessível entre cochichos, tanto melhor. Lênin e Hitler já haviam descoberto que a mentira integral é mais fácil de impor do que mentirinhas parciais. 

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