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As cabeças e a missão

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 6 de maio de 2010

Enojado com o artificialismo dos costumes na côrte de Henrique VIII, Thomas More observou que a mentira política, quanto mais patente e boboca, mais solicitamente é aceita como verdade por aqueles a quem, no fundo, ela não engana de maneira alguma. Decorridos vários séculos, belo exemplo da validade permanente dessa máxima é o acordo assinado entre Brasil e Paraguai para “reprimir o narcotráfico”, lindo evento diplomático seguido de trocas de tiros, não com os traficantes das Farc, mas entre a Polícia Federal do primeiro signatário e a Marinha do segundo (v. http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u729317.shtml). Como ambas as partes sabem que a guerrilha colombiana domina o narcotráfico na fronteira, mas ao mesmo tempo comprometem-se a combater tão somente o crime abstrato, puro, platônico, sem tocar na realidade viva das conexões políticas que o originaram, o protegem e dele se alimentam, torna-se evidente que todo o esforço de cada um dos contratantes residirá em fazer o melhor que possa para impedir que as ações do outro contra o banditismo tenham qualquer resultado substantivo: haja o que houver, as Farc não serão arranhadas. Tão sério é esse compromisso, que aqueles que o assumiram não hesitam em cumpri-lo à bala. Quem disse que não existe heroísmo entre picaretas?

Eis aí, pela bilionésima vez, o sinal de que, na leitura dos tratados internacionais e declarações políticas em geral, o estudante não deve excluir a possibilidade de que signifiquem precisamente o contrário do que dizem. A única diferença entre o reinado de Henrique VIII e o mundo moderno é que na época do primeiro só eram obrigados a dizer amém à mentira oficial os membros do círculo mais próximo do rei. O povo, à distância, e os intelectuais, no recesso protegido da universidade, sabiam que tudo aquilo era uma palhaçada, e riam. Hoje, com os meios de comunicação de massa e a instrumentalização das universidades como meios de “transformação social”, o auto-engodo obrigatório se impõe a toda a população e os intelectuais em peso são os primeiros a legitimá-lo, cada um sentindo uma angústia, um peso na consciência toda vez que se recusa a acompanhar seus pares, mesmo por minutos, no exercício de tão honrosa missão. Se você não entra no jogo, é excluído não só da corriola palaciana, como antigamente, mas do seu grupo de amigos, do emprego, da família, do universo. Por isso é que o mundo moderno, se ainda não é o império geral da mentira anunciado no livro do Apocalipse, pelo menos dá o melhor de si para aproximar-se desse ideal sublime.

Vejam o que aconteceu com o dr. Joseph Sonnabend, epidemiologista e um dos criadores da prestigiosa Foundation for AIDS Research. Um belo dia ele recebeu um press release emitido pelo próprio departamento que ele chefiava. A coisa dizia que a Aids assumira proporções epidêmicas, já não era um risco limitado à parcela mais vulnerável da comunidade homossexual, mas era um perigo iminente para toda a humanidade. “Que besteira é essa? Eu nunca assinei essa porcaria!”, protestou o perplexo doutor. Antes que ele obtivesse uma explicação, a mentira alarmista já tinha virado capa da revista Life, com o título: “Aids: Ninguém está a salvo”. Só quando a farsa já havia se espalhado pelos quatro quadrantes da Terra como verdade científica incontestável uma alma caridosa explicou ao dr. Sonnabend que tudo era um plano da Foundation e da indústria farmacêutica para arrancar verbas do governo americano (v. http://www.youtube.com/watch?v=lfnYciuXeB4). Na verdade, a Aids nunca foi um perigo sério para a população heterossexual e, hoje, não é absolutamente risco nenhum. Confirma-se assim, linha por linha, a denúncia que em 1993 o jornalista Michael Fumento apresentou em seu livro The Myth of Heterosexual Aids (v. http://www.fumento.com/myth.html). Mas dizer indústria farmacêutica é dizer Rockefeller, e dizer Rockefeller é dizer Council of Foreign Relations, Bilderberg Club e, no fim das contas, Nova Ordem Mundial – as mesmas organizações e entidades que estão por trás do climategate, das campanhas mundiais abortista e gayzista, da nova religião global biônica, da proposta do governo Obama para o controle universal da circulação de capitais, etc. etc. – a lista das maravilhas não tem mais fim. Quem vai dar um basta em tudo isso? Ninguém. A imposição da bestialidade organizada vem precedida de programas educativos calculados para desarmar a inteligência humana, desde a mais tenra infância, contra a força hipnótica das mais tolas mentiras de polichinelo. Henrique VIII mandou cortar a cabeça de Thomas More quando este se recusou a continuar fazendo vista grossa. A Nova Ordem Mundial não corta cabeças: zela para que elas não cresçam até um ponto em que precisem ser cortadas.

E não é só o sistema educacional que serve a esse fim. Para vocês fazerem uma idéia da colaboração prestimosa da “grande mídia” com a microcefalia global planejada, vejam como os medalhões do jornalismo americano responderam ao novo livro do repórter Aaron Klein, The Manchurian President, que investiga, com mais de oitocentos documentos, as relações íntimas entre Barack Obama e tudo quanto é organização comunista, islamofascista e anti-americana nos EUA. Antes mesmo de poder lê-lo, assim reagiram aquelas belas almas ao mero anúncio de que o livro estava para ser publicado (v. http://www.wnd.com/index.php?fa=PAGE.view&pageId=149313):

“Nunca, nunca mais me contactem”, respondeu o redator da Time, Jeffrey Kluger.

“Porcaria ridícula” (John Oswald, editor do New York Daily News).

“Lixo sensacionalista que não interessa a nenhuma publicação séria” (Rana Foroohar, editora adjunta da Newsweek).

“Tirem-me da sua lista” (Nancy Gibbs, editora da Newsweek).

“Vão cuidar das suas vidas” (David Knowles, comentarista político da America Online).

“Isso é ofensivo” (Ben Wyskida, diretor de publicadade de The Nation).

E assim por diante. A dedicação dos grandes do jornalismo atual à ocultação de notícias politicamente indesejáveis não é um capricho de momento, uma frescura, uma leviandade: é um compromisso sério, profundo, inflexível. É uma missão de vida.

A burguesia indefesa

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 17 de agosto de 2009

Quem quer que, mais de uma década atrás, estudasse com atenção as atas do Foro de São Paulo e as confrontasse com as ações de seus membros espalhados por duas dúzias de países teria chegado fatalmente, tal como eu mesmo cheguei, às seguintes conclusões:

1. O Foro era uma peça vital no esquema do terrorismo e do narcotráfico internacionais (não somente latino-americanos).

2. Criação quase que exclusivamente brasileira, ele tinha no Brasil o seu centro de comando estratégico e em outros países-membros as suas vanguardas incumbidas das ações táticas mais imediatas e espetaculares.

3. Isso bastava para demonstrar que a aparente distinção entre uma “esquerda revolucionária” e uma “esquerda democrática”, personificadas respectivamente por Hugo Chávez e Lula, não passava de uma camuflagem calculada para ocultar a unidade estratégica do conjunto.

4. No quadro do Foro, a articulação da esquerda com quadrilhas de delinqüentes, que já se preparava desde os anos setenta (v. meu livro de 1993, A Nova Era e a Revolução Cultural, Apêndice I, em http://www.olavodecarvalho.org/livros/neesquerdas.htm), sofreu um upgrade formidável, permitindo que as FARC se tornassem as senhoras absolutas do narcotráfico no continente e as controladoras de várias organizações criminosas menores, como o PCC e o Comando Vermelho.

5. A articulação perfeita da violência criminosa com a luta política legal (transformada ela própria, portanto, em instrumento do crime) estendia um manto de proteção continental sobre terroristas e narcotraficantes que operassem em países estrangeiros e tornava a América Latina inteira um território livre para a atuação desses delinqüentes.

Se essas obviedades permaneceram invisíveis até muito recentemente, foi pelas seguintes razões:

1. As organizações da esquerda legal tinham, em todas as redações de jornais e noticiários de TV e rádio, um número suficiente de representantes, inclusive nos mais altos postos, para desestimular e bloquear qualquer investigação séria sobre as atividades do Foro.

2. As vastas conexões internacionais da organização, envolvendo interesses financeiros gigantescos, davam-lhe os meios de ter à sua disposição, infiltrados em governos, think tanks, institutos de pesquisa, universidades e empresas privadas, um enorme contingente de experts e consultores habilitados a desviar atenções e, se preciso, a negar peremptoriamente os fatos, usando o peso do seu prestígio acadêmico como arma publicitária para cobrir de ridículo quem quer que tentasse averiguar a realidade por trás das mentiras e desconversas.

3. Através da estratégia gramsciana de “ocupação de espaços”, a esquerda conseguiu munir-se de todos os instrumentos para desmantelar preventivamente qualquer possibilidade de oposição ideológica. O instrumento mais usado para isso foram as denúncias espetaculosas de corrupção, que destruíram tantas lideranças ao mesmo tempo que davam aos partidos de esquerda, sob o manto da afetação de probidade, os meios para ir construindo discretamente esquemas de corrupção incomparavelmente maiores e mais eficientes do que os denunciados (dos Anões do Orçamento ao Mensalão o crescimento escalar foi de uma ameba para um dinossauro).

4. No campo cultural e psicológico, a progressiva substituição dos critérios morais de senso comum pelas chantagens “politicamente corretas” destituiu as possíveis oposições até mesmo do direito a uma linguagem própria, forçando-as a adaptar-se ao vocabulário e aos modos de pensar do adversário onipotente. Com espantosa facilidade, essa operação reduziu os liberais e conservadores aos protestos vãos de uma oposição castrada, voluntariamente apolítica, que se contentava, no máximo, com críticas administrativas e vagas denúncias de corrupção quase que literalmente copiadas do discurso “ético” da esquerda, as quais, nesse contexto, só faziam conceder ao inimigo o monopólio do combate ideológico.

5. Tão avassaladora foi a conquista do espaço psicológico pela esquerda, que nos próprios meios “direitistas” qualquer tentativa de descrever o real estado de coisas era recebida com extrema má-vontade, valendo ao atrevido o apelido de “teórico da conspiração”, senão a pecha de “extremista”. A obstinação de liberais e conservadores em não querer enxergar o que estava se passando permitiu que o germe da revolução latino-americana crescesse e se tornasse o monstro de mil braços que agora vai dominando o continente sem encontrar resistências senão locais e esporádicas, incapazes de fazer face a um perigo de tais dimensões.

Se algo aprendi nos dezesseis anos que decorreram desde meus primeiros avisos sobre a mais vasta e silenciosa trama revolucionária que já se viu no mundo, foi que a “burguesia” é a classe mais indefesa que existe. Acovardada perante o prestígio dos vigaristas intelectuais mais baixos e sórdidos, ela se apega a qualquer pretexto para enxergar, no inimigo que planeja assassiná-la, todas as virtudes mais róseas e fictícias e evitar assim o confronto com uma realidade temível. O famoso “aparato ideológico da burguesia”, de que falam os marxistas, jamais existiu. Ele é apenas uma projeção invertida do próprio aparato ideológico revolucionário, destinada a impedir, mediante a denúncia preventiva de maquiavelismos imaginários, que um dia um real aparato burguês de autodefesa venha a existir. Quando a burguesia, pelo menos brasileira, consente em dizer algo em seu próprio favor, ela o faz com tanta discrição e delicadeza que dá a impressão de estar disputando com o adversário mais bondoso e compreensivo do mundo, e não com as “máquinas de matar” que os revolucionários se orgulham de ser.

O mundo brasilianiza-se

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 01 de maio de 2008

Outro dia, como um cidadão da República Checa me explicasse que tudo por lá é bagunça, corrupção e sem-vergonhice, mostrei-lhe duas fotos: na primeira o nosso ministro da Cultura beijava na boca o cantor Lulu Santos, na segunda a esposa do mesmo ministro se esfregava no governador da Bahia e respectiva primeira-dama – tudo isso em público, e subsidiado pelo dinheiro do contribuinte.

Meu interlocutor arregalou os olhos e deu-se por vencido:

— Lá em Praga não tem disso não.

Mais uma vez a Europa se curvava ante o Brasil. Não satisfeito com a humilhação do concorrente, expliquei-lhe o Mensalão, o assassinato de Celso Daniel, o financiamento estatal da destruição de fazendas, os quilombolas, as repúblicas indígenas emergentes, os cinqüenta mil homicídios anuais, o analfabetismo universitário, o Dicionário Crítico do Pensamento da Direita , a pedagogia do prof. Carlão, os progressos do narcotráfico, o pacto PT-Farc assinado no Foro de São Paulo, a fortuna do Lulinha e, para completar, os 69 por cento de aprovação de tudo isso.

O homem baixou a cabeça e reconheceu que a República Checa é uma filial da Ordem Franciscana.

— Afinal, a corrupção por lá vem toda de fora, dos russos.

— A nossa, não. É nacional legítima.

Sim, meus amigos, essa é a verdade. Não se deixem enganar por sinonímias ilusórias. Termos como “corrupção”, “decadência”, “esculhambação”, têm equivalentes em todas as línguas. Mas nomes de fatos e qualidades não vêm acompanhados dos respectivos índices quantitativos. O que singulariza a desordem brasileira não se expressa em palavras, mas em números. É a dimensão, o tamanho descomunal, inalcançável à imaginação da platéia estrangeira, cujo cérebro automaticamente rejeita a estranheza insuportável, reduzindo o fenômeno às proporções daquilo que conhece e achando que na sua terra tudo se passa como em Brasília e Catolé do Rocha.

Só a exposição detalhada permite captar a diferença. E aí não há como escapar à conclusão: somos insuperáveis. Embora sob um aspecto ou outro possamos levar desvantagem, no conjunto a depravação nacional é um fenômeno inédito, incatalogável, sem similares na história do mundo. Nenhuma nação jamais consentiu em tolerar o intolerável com aquele misto de indiferença búdica, amoralismo cínico e auto-satisfação masoquista que o Brasil chama de “normalidade institucional”.

Mas algo me diz que nossos dias de glória estão contados. Aqui e ali, aos poucos, vão despontando indícios de que certas condutas, antes julgadas inaceitáveis fora das nossas fronteiras, vão conquistando espaço nas sociedades ditas avançadas, aí encontrando a mesma receptividade cúmplice que tanto as fez prosperar no Brasil.

Na sua breve carreira de pré-candidato, o sr. Barack Obama já contou, comprovadamente, mais de sessenta mentiras só sobre a sua biografia (excluídas as mentiras políticas). Ele mente sobre suas origens, sobre sua família, sobre sua educação, sobre seus amigos, sobre o pastor da sua igreja. Nenhum político faz isso. Todos são verazes nas miudezas para poder falsificar melhor o conjunto. Obama mente no atacado e no varejo, no todo e nos detalhes, até em detalhes óbvios que não levam meia hora para ser desmentidos. Chamá-lo de mentiroso seria eufemismo. Ele é uma farsa total, uma palhaçada completa. É um intrujão desprezível que em situações normais alcançaria sucesso, no máximo, como locutor de rádio interiorana. Sua simples candidatura – para não falar da possibilidade da sua eleição – mostra que a capacidade de julgamento do eleitorado americano desceu abaixo do nível do ridículo: está beirando o tragicômico. Quanto mais se comprova que o sujeito é postiço, mais devotos se tornam os seus seguidores. Cada vez que ele é desmascarado, mais o aplaudem. Já vão para oitenta por cento os democratas que juram votar nele. É um efeito que, até algum tempo atrás, só se observava num único país do mundo. O bom e velho país dos otários que, para não dar o braço a torcer, fingem admirar o malandro que os engana.

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