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Sexólogos mirins (I)

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 23 de junho de 2015

          

“Maturidade é tudo” (Shakespeare)

Em praticamente tudo o que leio e ouço a respeito de sexo, desejo e amor, reina a mais tosca e pueril indistinção entre as experiências mais diversas associadas a esses termos, quase sempre tomados como sinônimos.
No seu nível mais imediato e fisiológico, o desejo é um fenômeno puramente interno, produto da química hormonal sem objeto definido e que, por isso mesmo, pode ser em seguida projetado sobre qualquer objeto real ou imaginário. É uma pura urgência fisiológica, um “desejo de gozar” que aparece sem a necessidade de nenhum excitante externo e pode ser satisfeito por mera fricção mecânica da genitália – masculina ou feminina.
Bem diferente é o desejo despertado pela visão direta ou indireta de um objeto, de um corpo desejável. Invariavelmente o fator excitante é aí algum traço sexual secundário ao qual o sujeito seja particularmente sensível: peitos, traseiros, pernas, olhos, etc. Este é o nível que corresponde tecnicamente à noção escolástica da concupiscentia. Comentários de garotões de praia ante as transeuntes que lhes parecem gostosas são uma enciclopédia das expressões verbais que manifestam esse tipo de desejo.
Num terceiro nível o desejo não é despertado por nenhuma característica física mais saliente, mas por uma impressão geral, indefinida e não-localizada de beleza ou charme, quase uma aura mágica em torno do objeto desejado.
Logo acima disso vem a paixão, o enamoramento, o coup de foudre que torna o objeto uma presença obsessiva e insubstituível na mente do apaixonado. Esta emoção é repleta de ambiguidades. Traz inevitavelmente consigo a ansiedade, o medo da rejeição, e aciona um conjunto de mecanismos psicológicos de defesa contra a frustração possível.
Vencidas essas ambiguidades, o enamoramento pode se consolidar num sonho conjugal, o anseio de ter a pessoa amada ao nosso lado para sempre. Neste nível o desejo assume tons de um valor moral, destinado a manifestar-se na aceitação comum de sacrifícios para o benefício mútuo, para a criação de uma família, para a aceitação de responsabilidades sociais, etc. A resistência maior ou menor às dificuldades pode levar a resultados que vão desde a criação de uma família estável até uma variedade de desastres conjugais.
Só no topo da experiência conjugal com todas as suas ambiguidades é que pode, no entanto, surgir o verdadeiro e genuíno amor, no sentido pleno da palavra, que é o impulso firme, constante e irrevogável de tudo sacrificar pelo bem da pessoa amada, de perdoar sempre e incondicionalmente os seus defeitos e pecados, de protegê-la de todo mal e de toda tristeza, ainda que com o risco da nossa própria vida, e de conservá-la ao nosso lado como o nosso bem mais precioso, não só nesta existência terrestre, mas por toda a eternidade.
Cada um desses níveis engloba e transcende o anterior, e só quem passa à fase seguinte compreende o que estava em jogo na anterior.
É evidente que só quem percorreu o trajeto inteiro está habilitado a formar uma visão abrangente e objetiva da experiência sexual, que os outros só enxergam de maneira parcial e subjetivista – não raro solipsista – determinada pela sua fixação numa etapa que se recusa a passar.
Infelizmente, este último é o caso da maioria dos “formadores de opinião”, universitários ou midiáticos, que se oferecem gentilmente para modelar a vida sexual alheia segundo a medida do seu próprio subdesenvolvimento existencial.
Muitos não se contentam com isso e fazem da sua própria consciência atrofiada um critério de moralidade com base no qual julgam e condenam o que não compreendem. São esses que denomino “sexólogos mirins”: almas atrofiadas que querem ajustar vida sexual alheia ao molde da sua própria pequenez.

Basta! Fora!

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 11 de junho de 2015

          

Volto a explicar, agora ponto por ponto, a catástrofe estratégica monstruosa com que o PT destruiu a si mesmo e à nação.
1. No incipiente capitalismo brasileiro, as grandes empresas são quase sempre sócias do Estado, o único cliente que pode remunerá-las à altura dos serviços que prestam.
2. Por isso elas acabam se incorporando ao “estamento burocrático” de que falava Raymundo Faoro: o círculo dos “donos do poder”, que fazem da burocracia estatal o instrumento dócil dos seus interesses grupais, em vez da máquina administrativa impessoal e científica que ela é nas democracias normais.
3. Nesse sentido, o sistema econômico brasileiro não é capitalista nem socialista, mas sim patrimonialista, como destacaram, além do próprio Faoro, vários estudiosos de orientação liberal, entre os quais Ricardo Velez Rodriguez, Antonio Paim e o embaixador J. O. de Meira Penna.
4. Nos anos 70 do século passado os intelectuais de esquerda que sonhavam em formar um grande partido de massas tomaram conhecimento do livro de Raymundo Faoro, Os Donos do Poder. Formação do Patronato Político Brasileiro, então lançado em aumentadíssima segunda edição, e entenderam que o curso normal da revolução brasileira não deveria ser propriamente anticapitalista, mas antipatrimonialista: o ponto focal do combate já não seria propriamente “o capitalismo”, e sim – com nomes variados — o “estamento burocrático”.
5. A definição do alvo era corretíssima, mas, ao mesmo tempo, o partido, como aliás toda a esquerda nacional, estava intoxicado de gramscismo e ansioso por tomar o poder por meio dos métodos do fundador do Partido Comunista Italiano, que preconizavam a infiltração generalizada e a “ocupação de espaços” destinadas a criar a “hegemonia”, isto é o controle do imaginário popular, da cultura, de modo a fazer do partido “o poder onipresente e invisível de um imperativo categórico, de um mandamento divino”.
6. A aplicação do esquema gramscista obteve mais sucesso no Brasil do que em qualquer outro país do mundo. Por volta dos anos 80, o modo comunopetista de pensar já havia se tornado tão habitual e quase natural entre as classes falantes no país, que os liberais e conservadores, inimigos potenciais dessa corrente, abdicaram de todo discurso próprio e, para se fazer entender, tinham de falar na linguagem do adversário, reforçando-lhe a hegemonia ideológica, mesmo quando obtinham sobre ele alguma modesta vitória eleitoral em troca. Entre os anos 90 e a década seguinte, toda política “de direita” havia desaparecido do cenário público, deixando o campo livre para a concorrência exclusiva entre frações da esquerda, separadas pela disputa de cargos apenas, sem nenhuma divergência séria no terreno ideológico ou mesmo estratégico.
7. O sucesso da operação produziu sem grandes dificuldades a vitória eleitoral de Lula numa eleição presidencial na qual, como ele próprio reconheceu, todos os candidatos eram de esquerda, o que canalizava os votos quase espontaneamente na direção daquele que personificasse o esquerdismo da maneira mais consagrada e mais típica.
8. Com Lula na Presidência, intensificou-se formidavelmente a “ocupação de espaços”, fortalecendo a hegemonia ao ponto de levar ao completo aparelhamento da máquina estatal pelo comando comunopetista, que ao mesmo tempo precisava da ajuda das grandes empresas para cumprir o compromisso assumido no Foro de São Paulo, coordenação estratégica da política comunista no continente, no sentido de amparar e salvar do naufrágio os regimes e movimentos comunistas moribundos espalhados por toda parte.
9. Inevitavelmente, assim, o próprio partido governante se transformou no “estamento burocrático” que ele havia jurado destruir. E, imbuído da fé cega nos altos propósitos que alegava, atribuiu-se em nome deles o direito de trapacear e roubar em escala incomparavelmente maior que a de todos os seus antecessores, sem admitir acima de si nenhuma autoridade moral à qual devesse prestar satisfações. O próprio sr. Lula expressou esse sentimento com candura admirável, afirmando-se o mais insuperavelmente honesto dos brasileiros, ao qual ninguém teria o direito de julgar – e isso no momento em que seu partido, abalado por uma tremenda sucessão de escândalos, já era conhecido no país todo como o partido-ladrão por excelência.
10. Assim, não apenas o PT fortaleceu o patrimonialismo, como frisou o cientista político Ricardo Velez Rodriguez, mas se transformou ele próprio na encarnação mais pura e aparentemente mais indestrutível do poder patrimonialista, soldando numa liga indissolúvel a ilimitada pretensão esquerdista ao monopólio da autoridade moral, os anseios do movimento comunista continental, os interesses de grandes grupos industriais e bancários, o aparato cultural amestrado (mídia, show business, universidades) e, last not least, o instinto de sobrevivência da classe política praticamente inteira.
11. Tal foi o resultado da síntese macabra que denominei faoro-gramscismo — a tentativa de realizar por meio da estratégia de Antonio Gramsci a revolução antipatrimonialista preconizada por Raymundo Faoro: na medida em que, ao mesmo tempo, instigava o ódio popular ao “estamento burocrático” e, por meio da “ocupação de espaços”, se transfigurava ele próprio no inimigo odiado, personificando-o com traços repugnantes aumentados até o nível do absurdo e do inimaginável, o PT acabou por atrair contra si próprio, em escala ampliada, a hostilidade justa e compreensível da população aos “donos do poder”, aos príncipes coroados do Estado cleptocrático.

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“NÓS ENCONTRAMOS O INIMIGO E ELE SOMOS NÓS”, DIZ O PERSONAGEM POGO, CRIADO POR WALT KELLY(1913-1973)
12. Ao longo do processo, a “ocupação de espaços” reduziu o sistema de ensino e o conjunto das instituições de cultura a instrumentos para a formação da militância e a repressão ao livre debate de ideias, destruindo implacavelmente a alta cultura no país e, na mesma medida, estupidificando a opinião pública para desarmar sua capacidade crítica. Ao mesmo tempo, no desejo de agradar a vários “movimentos de minorias” enxertados no Brasil por organismos internacionais, o governo petista fez tudo o que podia para desmantelar o sistema dos valores mais caros à maioria da população, contribuindo para espalhar a confusão moral, a anomia e a criminalidade, esta última particularmente favorecida por legislações que não se inspiravam propriamente em Antonio Gramsci, mas numa fonte mais remota do pensamento esquerdista, a apologia do Lumpenproletariat como classe revolucionária, muito em voga nos anos 60 do século XX.
O Brasil que o PT criou é feio, miserável, repugnante, tormentoso e absolutamente insustentável. Cumprida a sua missão histórica de encarnar, personificar e amplificar o mal que denunciava, o único partido da História que fomentou uma revolução contra si mesmo tem a obrigação de ser coerente e desaparecer do cenário o mais breve possível.
Por isso a mensagem que o povo lhe envia nas ruas, nos panelaços, nas vaias e nas sondagens de opinião é hoje a mesma que, em circunstâncias muito menos deprimentes e muito menos alarmantes, surpreendeu o desastrado e atônito presidente João Goulart em 1964:
– Basta! Fora!

Cretinices gramscianas (II)

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 7 de junho de 2015          

A teoria embutida no espaço entre o fato e a generalização que Gramsci dela extrai é a própria teoria gramsciana da hegemonia, segundo a qual a cultura reinante em qualquer época ou lugar é o instrumento pelo qual a classe dominante impõe sua ditadura mental a toda a população.
Interpor uma teoria entre os fatos e a conclusão, em vez de esperar que a própria acumulação de fatos sugira a conclusão, já é trapaça suficiente para desmoralizar qualquer teorizador.
Mas a teoria da hegemonia ultrapassa os últimos limites da vigarice razoável e tenta nos fazer engolir como realidade universal e constante algo que é uma impossibilidade material pura e simples.
Essa impossibilidade já estava presente na teoria marxista da “ideologia de classe”, da qual a “hegemonia” gramsciana é um prolongamento.
Se cada classe tem uma ideologia que é a expressão idealizada dos seus interesses materiais, então, das duas uma: ou cada um dos seus membros está atrelado de uma vez para sempre à ideologia da sua classe como se fosse uma segunda natureza; ou, ao contrário, pode abjurar dela e aderir à ideologia de outra classe, como fez, ou acreditava fazer, o próprio Karl Marx.
Só que neste caso não há mais conexão orgânica entre classe e ideologia; tudo se torna uma questão de livre escolha e não há mais “ideologia de classe” nenhuma, só a ideologia que cada indivíduo, livremente, atribui à sua classe ou a uma outra qualquer, conforme a interpretação que faça dos interesses desta ou daquela.
Gramsci agrava formidavelmente a situação ao declarar que quem produz a ideologia não são propriamente os membros de cada classe, mas sim os “intelectuais” que a representam sem ter de pertencer necessariamente a ela.
Esses representantes são “intelectuais orgânicos” da burguesia e do proletariado. Mas, se o são sem precisar ser eles próprios burgueses ou proletários, a conexão entre eles e a classe que representam não pode ser “orgânica” de maneira nenhuma e sim matéria de livre escolha, nada impedindo que um intelectual passe, ideologicamente, da “burguesia” para o “proletariado” (como Georg Lukács) ou vice-versa (Eric Hoffer, por exemplo).
Ademais, quem infunde nos intelectuais a “ideologia de classe”? Para que o burguês adestrasse intelectuais na ideologia burguesa seria preciso que ele, na condição de mestre, a dominasse melhor que os discípulos: esse burguês seria, então, um superintelectual, um intelectual dos intelectuais, o maître à penser da intelectualidade, reduzindo-a à condição de mera repetidora do discurso aprendido.
Mutatis mutandis, e piorando ainda mais as coisas, os “intelectuais orgânicos” do proletariado se tornariam meninos de escola operária, tomando lições de dialética hegeliana e materialismo histórico com professores pedreiros e ferramenteiros.
Essas situações caricaturais não existem na realidade, no mínimo porque o próprio Gramsci nos assegura que quem cria as ideologias das classes não são as próprias classes, e sim os intelectuais.
Nem poderia ser de outra forma. No mínimo a transposição de interesses materiais numa linguagem de valores, ideias e teorias requer um considerável treinamento especializado nas áreas de filosofia e ciências humanas, que nem um capitalista nem um operário poderiam adquirir nas horas vagas. (Sob esse aspecto é interessante comparar o gramscismo com a teoria da “violência simbólica” de Pierre Bourdieu, outro ídolo, ainda que menorzinho, da intelectualidade esquerdista; (leia aqui e aqui).
Mas, então, nem a ideologia proletária é proletária nem a burguesa é burguesa: são ambas puras criações de intelectuais, que as atribuem a esta ou àquela classe, sem precisar consultá-las, conforme interpretem livremente os “interesses” de cada uma. Não é coincidência, pois, que Karl Marx já tivesse descrito a “ideologia proletária” inteira antes de ter visto de perto um único proletário.
Na melhor das hipóteses, o burguês e o proletário se tornam “tipos ideais” que existem apenas na cabeça do intelectual para fins de comparação com personagens reais que só se parecem com eles de maneira longínqua e esquemática.
Gramsci não admite explicitamente essa conclusão inevitável da sua teoria, mas, como quem não quer nada, extrai dela uma consequência prática que, para o bom entendedor, já denuncia a falácia da construção inteira.
Quem cria as ideologias de classe? Os intelectuais. Quem, com base nela, cria a hegemonia, o controle geral do pensável e do impensável? Os intelectuais. Quem lidera a revolução? Os intelectuais. Quem assume o poder por meio da revolução? Os intelectuais.
Burgueses e proletários são, no fim das contas, apenas os emblemas dos times em jogo. É de espantar que no paraíso burguês os burgueses sejam esfolados com impostos, induzidos a financiar filmes e shows que os demonizam e a contribuir com rios de dinheiro para organizações esquerdistas que prometem matá-los?
É de espantar que no paraíso proletário os proletários sejam submetidos a condições de trabalho escravo, privados do direito de greve, removidos de um lugar para outro sem poder reclamar, policiados vinte e quatro horas por dia e obrigados a entoar cânticos de glória ao Supremo Intelectual e Guia dos Povos?
Tudo não passa, então, de uma disputa de poder entre dois grupos de intelectuais, cada um defendendo os interesses que atribui a uma classe à qual não tem de pertencer e que na maior parte dos casos não foi consultada a respeito.
O que é líquido e certo, embora Gramsci não o diga, é que os intelectuais orgânicos “da burguesia” não pretendem tomar o lugar dela; quem o pretende são os outros, os “intelectuais proletários”.
Nunca se viu um escritor apologista do capitalismo ansioso para deixar de lado seus afazeres intelectuais e tornar-se industrial ou especulador da bolsa. Em contrapartida, nenhum, absolutamente nenhum “intelectual proletário” que eu conheça planeja fazer a revolução proletária para depois continuar vivendo modestamente das suas funções de professor, jornalista ou pesquisador científico.
Tomar o poder e exercê-lo na máxima medida das suas possibilidades é a essência e missão da intelectualidade revolucionária. O que ela quer não é assumir o lugar da intelectualidade direitista, mas o da burguesia.
Isso torna evidente que, na maior parte dos casos, ela disputa o poder com um grupo que não o detém nem o deseja. Basta isso para explicar a inermidade estrutural da intelectualidade conservadora e liberal ante o avanço esquerdista.
É algo que não tem nada a ver com superioridade ou inferioridade intelectuais, mas com desejo ou falta de desejo de poder. Quando o sr. Lula sentenciou que seus inimigos “não tinham perspectiva de poder”, acertou na mosca.
Para completar a fantasia com um toque de alucinação, Gramsci admite que nem todos os intelectuais participam conscientemente da “luta de classes”. Alguns – em geral a maioria deles – são indiferentes à política e se satisfazem com suas ocupações filosóficas, científicas ou artísticas, sem se preocupar em saber quem isso vai favorecer nas próximas eleições.
A esse grupo Gramsci denomina “intelectuais tradicionais”, acrescentando que são neutros e apolíticos só em imaginação, por falsa consciência; na verdade são servos inconscientes do status quo tanto quanto os intelectuais orgânicos “burgueses”.
Ou seja: os “intelectuais proletários” estão em perpétua disputa de poder não somente com intelectuais orgânicos burgueses que não aspiram ao poder, mas com toda uma comunidade intelectual que não quer nem saber da existência dessa disputa.
A consequência disso, do ponto de vista cognitivo, é devastadora: o intelectual esquerdista explica toda a sociedade como uma projeção inversa dos seus próprios valores e metas, pouco lhe importando a auto explicação que os demais grupos e indivíduos tenham a apresentar.
Para ele, a sociedade, a história, a existência humana inteira giram em torno do seu objetivo grupal, da sua luta pelo poder, que no seu entender move todo o restante como o cão abana a cauda. Ele, em suma, é o fator ativo, o criador da História, a única realidade efetiva: todo o resto da humanidade são sombras que se mexem à sua voz de comando.
É uma visão horrivelmente autocêntrica, solipsista, psicótica mesmo, que se espalha com facilidade entre estudantes universitários pelo simples fato de que é a mais reconfortante compensação neurótica do seu justo sentimento de inutilidade social.

***

Não é só na esquerda militante que o pensamento de Gramsci inocula o seu veneno alienador e estupidificante. Chego a pensar que basta admirá-lo um pouquinho, suspender o juízo crítico por uns instantes, para que algo do besteirol gramsciano entre e permaneça para sempre.
Por ocasião de um de seus últimos chiliques anti-olavéticos, cuja razão de ser escapa ao entendimento humano, o sr. Marco Antônio Villa, na ânsia doida de exaltar tudo o que critico, chegou a proclamar que a subsistência da democracia na Itália do pós-guerra foi obra do gramscismo imperante no Partido Comunista Italiano.
É com certeza a coisa mais burra que já saiu da boca de um pretenso historiador. Raiva descontrolada é vexame na certa. O regime democrático só sobreviveu na Itália graças à derrota acachapante que, contra todas as previsões iluminadas, a Democracia Cristã de Alcide De Gasperi, mobilizando o apoio de toda a população católica na primeira eleição geral realizada após a queda do fascismo, impôs em 18 de abril de 1948 ao Front Popular comunista, que desde então foi saindo do cenário político, por etapas sucessivas, para a lata de lixo da História.
Se o sr. Villa quiser alguma bibliografia sobre o assunto, posso lhe fornecer, mas só se ele pedir com jeito.

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