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Notas para um índice

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 21 de setembro de 2009

A semana foi tão rica em acontecimentos políticos dignos de atenção, que não resta ao comentarista senão anotar brevemente uns poucos, como num índice temático, para analisá-los com mais detalhe na primeira oportunidade, se alguma houver.

Na escala nacional, veio, em primeiro lugar, a expressão de entusiasmo do sr. Presidente da República diante do fato de que “pela primeira vez na hiftória defte paíf”, uma eleição presidencial se realizará exclusivamente entre candidatos de esquerda. A memória do ilustre mandatário não é das melhores. Em 2002 os candidatos eram ele próprio, José Serra, Anthony Garotinho e Ciro Gomes, cada qual esforçando-se para mostrar, nos debates, que era mais esquerdista que os outros. Em 2006 o concorrente Geraldo Alckmin, além de parasitar o estilo politicamente correto com um servilismo exemplar, evitou cuidadosamente qualquer confronto ideológico por mais mínimo que fosse e ajudou o adversário a ocultar a existência do Foro de São Paulo. Se algum direitismo havia nele, permaneceu invisível, inodoro, imperceptível. O monopólio esquerdista do discurso ideológico não foi rompido em momento algum. A única novidade, agora, é que o governo celebra esse estado de coisas em vez de lamentá-lo como prova inequívoca de que a concorrência democrática normal foi extinta, de que, eliminada toda possibilidade de divergência ideológica, só o que sobrou foi a disputa de cargos entre grupos ideologicamente afins, isto é: o regime de partido único, com suas várias subcorrentes internas nomeadas como “partidos” só como concessão verbal provisória a eventuais nostalgias democráticas remanescentes, cada vez mais débeis e conformadas. A obscena alegria presidencial diante dessa monstruosidade prova que a substituição da democracia genuína pelo “centralismo democrático” leninista tem sido o objetivo de toda a esquerda brasileira há várias décadas, finalmente realizado acima de qualquer possibilidade de reversão do estado de coisas.

Concomitantemente, apareceu, no Estado de S. Paulo do dia 13, a confissão de vários guerrilheiros dos anos 70, de que haviam sido treinados e financiados, uns pela Coréia do Norte, outros pela China comunista. Mais uma prova, se alguma faltasse, de que a “luta armada” da esquerda não foi um empreendimento heróico de resistência democrática à ditadura (como poderia sê-lo, se começou antes de 1964?), mas sim um ato de traição, uma intervenção estrangeira, a manifestação local de um movimento subversivo mundial, bilionário, orientado e subsidiado pelas ditaduras mais sangrentas e genocidas que a humanidade já conheceu (v. http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/coreia-do-norte-treinou-guerrilha-brasileira/). Hoje em dia esse movimento está mais forte do que nunca (v. Robert Chandler, Shadow World. Ressurgent Russia, The Global New Left and Radical Islam, Washington D.C., Regnery, 2008) e, no Brasil, tem o poder total, excluída toda veleidade de oposição séria e reduzida a política às disputas internas da facção dominante.

Nos EUA, a maior manifestação de protesto da história americana, reunindo mais de um milhão de pessoas (v. as fotos em http://www.midiasemmascara.com.br/index.php? option=com_content&view=article&id=8626:contra-o-humanitarismo-de-estado&catid=104:outros&Itemid=122), foi solenemente ignorada pelos jornais e TVs, com exceção da FoxNews, exatamente como tinha acontecido com as manifestações preparatórias realizadas em duas mil cidades – um movimento mais vasto e poderoso do que todos os protestos dos anos 70 contra a guerra do Vietnã. Cada vez está mais claro que a “grande mídia” se tornou mero instrumento de ocultação e desinformação a serviço do aparato partidário-estatal esquerdista, reduzindo sua própria confiabilidade a zero. O espantoso na mobilização (voltada contra a política econômica do governo e especialmente contra o plano de saúde, o Obamacare, que muitos chamam de Obamascare) é que não tem nenhum financiamento bilionário por trás e nenhum apoio partidário (os republicanos chegaram tarde, rebocados pela massa). Se alguma vez houve no mundo um “movimento popular”, é esse.

Quase ao mesmo tempo, documentos divulgados pela Canadian Free Press mostram que a cúpula nacional do Partido Democrata, incluindo a sra. Nancy Pelosi, esteve consciente, desde o começo da campanha presidencial, de que Barack Obama, por falta de documentos que atestassem cabalmente sua nacionalidade americana, não tinha as qualificações legais para ocupar a presidência. Tão logo Obama foi escolhido, o Comitê Nacional Democrata redigiu uma declaração apresentando o candidato e afirmando que ele tinha essas qualificações. Em seguida esse documento foi escondido, e em seu lugar foi distribuído um outro, sem a menção às qualificações (leia a história inteira em http://canadafreepress.com/index.php/article/14583).

Logo que a questão dos documentos apareceu na internet, meses atrás, escrevi que a escolha de Obama não fora nenhum lapso, que ele tinha sido selecionado de propósito, precisamente por ser um pequeno farsante com uma história de vida totalmente inventada, portanto um sujeito fácil de chantagear e controlar e, mais ainda, um candidato ilegítimo cuja presença no mais alto cargo da nação era, por si só, um desafio aberto à Constituição – uma Constituição que há décadas os Clintons, os Gores, as Pelosis e tutti quanti sonham em destruir. Dito e feito. Hoje, oitenta por cento da equipe de governo são gente dos Clinton. Os vinte por cento restantes – a única parcela fiel a Obama – são os bandidinhos de Chicago, que, no fim das contas, não apitam nada. Obama é o instrumento perfeito para criar uma crise constitucional e, uma vez cumprido seu papel, pode ser jogado fora, restando no poder o velho esquema clintoniano. O modo de atuação dos bandidinhos também tornou-se claro no decorrer da semana, quando agentes da Acorn (a ONG que distribuiu títulos de eleitor falsos para favorecer a eleição de Obama, o qual no segundo dia de governo retribuiu o favor com uma verba federal de cinco bilhões de dólares – sim, cinco bilhões) foram flagrados ensinando cafetinas a cavar subsidios estatais para seus bordéis. São essas coisinhas que a gangue de Obama sabe fazer. A parte adulta do serviço é com os Clintons.

Ainda na mesma semana, os fatos mostraram a perfeita convergência de propósitos entre o governo Obama, a ONU e os generais da China na luta pela destruição da soberania americana e pela instauração de um governo mundial. Enquanto Obama anuncia uma política econômica que inevitavelmente traz de volta a inflação, os chineses, que têm enormes reservas de dólares, clamam pela instauração de uma moeda única em todo o planeta e são secundados nisso pelas mentes iluminadas da ONU. Só pessoas com QI inferior a 12 verão nisso um lindo encontro de coincidências. Criar dificuldades para vender facilidades é o truque mais velho do mundo, e não é a primeira vez que os globalistas o aplicam.

Por falar em articulações, vocês já repararam que as fontes do antitabagismo militante são as mesmas da campanha pela liberação das drogas pesadas? Estudem, pesquisem, raciocinem, e obterão aí uma lição inesquecível sobre como funciona o poder no mundo de hoje.

Astúcias de Chapolín

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 02 de maio de 2008

Num recente debate com o economista Rodrigo Constantino, no programa “Conversas Cruzadas” da TV gaúcha (http://www.youtube.com/watch?v=xxnn-lPglz4), o deputado Ciro Gomes assegurou que o único gasto excessivo do governo federal é o pagamento dos juros da dívida externa e que seria praticamente impossível sugerir, fora isso, qualquer corte de despesas que chegasse a um bilhão de reais. Aparentemente, nem ele nem seu interlocutor tinham a menor idéia de que a pletora de indenizações a terroristas – o gasto mais inútil e mais indecente que se poderia imaginar — já ultrapassou essa cifra há muito tempo. Também nenhum dos dois deu sinal de saber que, no orçamento deste ano, as despesas da Presidência estão em quase três bilhões, e os ministérios inventados pelo governo Lula, que não faziam a menor falta quando não existiam nem farão quando retornarem ao nada, estão consumindo 8 bilhões. Com toda a sua responsabilidade de ex-ministro da Integração Nacional, o sr. Ciro Gomes mostrou recordar, do Orçamento da União, só aquele detalhe que lhe dava a oportunidade de malhar uma vez mais o seu judas predileto, o “neoliberalismo”, esquecendo tudo o mais. Se não o esquecesse, não poderia conciliar sua ojeriza aos credores externos com a afirmativa esdrúxula de que o governo deveria é gastar mais em vez de menos. Pois, afinal, foi para gastar mais, e não menos, que se fez a dívida externa. Ou estou enganado?

Mesmo quanto ao alvo predileto dos seus ataques o sr. Gomes mostrou não saber grande coisa, pois voltou a insistir no cacoete mais estúpido da retórica oficial, os tais “quinhentos anos” de exploração capitalista, como se o “neoliberalismo” (seja isto lá o que for) tivesse começado com Pedro Álvares Cabral e como se toda a nossa história administrativa não tivesse sido, bem ao contrário, – e desde os tempos das Capitanias Hereditárias – uma novela de centralização, burocratismo e gastos públicos freqüentemente até maiores do que aqueles que o ex-ministro recomenda.

Presto sempre atenção ao que diz o sr. Ciro Gomes, porque é quase inevitável que mais dia, menos dia, ele se candidate de novo à Presidência, recuperando a chance que perdeu quando, em 2002, consentiu abjetamente em servir de sparring na farsa eleitoral mais grotesca da nossa História, uma festa em família entre companheiros de esquerdismo, todos empenhados em não bater demais no candidato petista cuja vitória pré-decidida era a única razão de ser daquela palhaçada toda.

Notem bem: o sr. Gomes não é nenhum idiota, é um dos homens mais inteligentes e uma das personalidades mais interessantes que já passaram por qualquer ministério desde a inauguração da Nova República. Seu problema não é burrice: é o oportunismo escorregadio que o faz querer passar por muito mais esquerdista do que é e comprometer-se com as políticas erradas mesmo quando está com a idéia certa na cabeça. Muitas vezes, no curso deste debate como em outros pronunciamentos, ele expressou opiniões gerais muito sensatas, mas entremeando-as de concessões de ocasião ao esquerdismo mais vulgar e estúpido, arruinando com uma profusão de detalhes falsos a verdade geral do que dizia. Ele faz isso porque padece de espertismo , a doença endêmica dos políticos brasileiros, que consiste em acabar virando bobo de tanto querer bancar o esperto. Se fosse mesmo esperto, o sr. Gomes jamais teria apostado nas luzes de meio watt do filósofo Roberto Mangabeira Unger, que é o pior tipo de visionário, o visionário sem visão. Nem daria como exemplo de interferência estrangeira danosa aos nossos interesses, como o fez neste debate, a pressão americana contra a venda de aviões à Venezuela. Não que ele seja bobo o suficiente para imaginar que um assunto desses pode ser enfocado só do ângulo econômico, ignorando as implicações militares mais patentes que determinam a atitude americana e a tornam, aliás, benéfica ao Brasil. Mas fazer-se de bobo só para não perder a chance de dar um agradinho nos chavistas de plantão não é esperteza nenhuma: como sempre acontece nessas ocasiões, a diferença entre a bobagem fingida e a bobagem autêntica tornou-se perfeitamente irrelevante, e a astúcia verbal do sr. Gomes acabou não se distinguindo em nada da do saudoso Chapolín Colorado.

Se o ex-governador do Ceará, com todo o seu talento, não se decidir a tornar-se ele mesmo em vez de continuar se amoldando por falsa esperteza àqueles que só pretendem utilizá-lo para fins que não são os dele, dificilmente virá a desempenhar na política brasileira um papel mais honroso do que na eleição presidencial de 2002.

Namoro com o genocídio

Olavo de Carvalho

Zero Hora, 17 de novembro de 2002

No artigo anterior, esqueci de mencionar, entre as entidades que resistiram bravamente ao totalitarismo petista no Rio Grande, a Associação dos Oficiais da Brigada Militar. Esqueci, talvez, porque a menção era óbvia demais. Se não fosse pela teimosia de seus oficiais, a Brigada talvez já nem existisse, substituída a esta altura por milícias de arruaceiros doutrinados, bem no feitio daqueles que, sob as bênçãos do governador e de seu secretário da Segurança, demoliram o relógio comemorativo dos 500 anos de Brasil.

“Quem sofreu sob o teu jugo te conhece”, dizia Nietzsche — e, evidentemente, só quem conhece pode ensinar quem não conhece. Daí a obrigação que cabe aos gaúchos, agora que exorcisaram o íncubo petista: mostrar ao resto da população a verdadeira face de um partido totalitário, no qual se depositam hoje as mais insensatas esperanças de um país que disse adeus à realidade.

É verdade que, no conjunto da militância petista, só uma fração é revolucionária, leninista, ditatorial. Mas, definitivamente, não estou entre os que levam muito a sério a distinção de “extremistas” e “moderados”, hoje elevada às alturas de um critério último para o prognóstico dos destinos nacionais. Moderação e extremismo, afinal, são apenas noções quantitativas, usadas para graduar alguma qualidade que, esta sim, é essencial, substantiva. Jamais a consideração da mera quantidade pode sobrepor-se, numa análise razoável, ao conhecimento da essência, do quid, da natureza do objeto em questão.

Em primeiro lugar, o movimento comunista, que tem 150 de existência, experiência, conhecimento e prática, sempre teve mão dupla, indo para cá ou para lá, freqüentemente para as duas direções ao mesmo tempo, conforme as conveniências.

A mente treinada na dialética de Hegel e Marx (para não falar das astúcias de Lênin e das sutilezas de Antonio Gramsci) habitua-se a jogar com as contradições não somente no plano teórico, mas no da ação prática, articulando o sim e o não num vai-não-vai estonteante, calculado para desorientar o adversário e induzi-lo à rendição ou ao suicídio. Uma das modalidades preferenciais dessa técnica consiste precisamente em assustar o infeliz com o fantasma do radicalismo para atirá-lo nos braços da alternativa “moderada”, de modo que aquilo que antes se evitava como à peste venha a ser aceito como um remédio salvador.

Essa armadilha é tão velha, tão gasta, que chega a ser comovente a ingenuidade patética com que nela vão caindo todas as lideranças empresariais e políticas deste país, soi disant espertíssimas, mas totalmente ignorantes dos principios mais elementares da estratégia comunista.

Em segundo lugar, colocar a opção entre petismo moderado e petismo radical no centro do debate nacional é simplesmente dar o último e decisivo passo para a total esquerdização da vida política no Brasil, com a conseqüente supressão de todas as oposições “de direita”.

Quantas vezes será preciso explicar que não se leva um país ao comunismo por meio da propaganda direta, simples e unívoca, e sim através da inteligente manipulação dos conflitos por meio do que Lênin chamava “estratégia das tesouras”? Não se trata de impor uma doutrina partidária explícita, mas de fazer com que um fundo de esquerdismo geral e difuso prevaleça em todos os partidos, inclusive os mais alheios a qualquer cumplicidade consciente com a esquerda. Quem observe a curva da evolução política do Brasil nos últimos vinte anos notará que, gradativamente, a dose de direitismo permitido foi diminuindo, diminuindo, até que, nas últimas eleições, a escolha do cidadão foi restringida a um mostruário de esquerdismos diversos. Na realidade, nem tão diversos: os partidos de Ciro Gomes e Garotinho são membros do Foro de São Paulo (coordenação geral do movimento comunista no continente), comprometidos ao menos informalmente a colaborar para a eleição de Lula, que essa entidade sempre considerou prioritária. A presença desses senhores no pleito — cinicamente alardeado como “o mais transparente de toda a nossa história” — funcionou apenas como excipiente inócuo para a substância petista que se pretendia injetar no eleitorado. Não é de espantar que ambos já tenham seu lugar prometido no novo governo. O terceiro e principal partido concorrente, o PSDB, mal terminadas as apurações já anunciava sua intenção de mover ao novo governo tão-somente uma “oposição light”, ficando, portanto, tudo em família. Mas, como todas as atenções nacionais tendem inevitavelmente a concentrar-se na alternativa entre dois petismos, o bonzinho e o malvadinho, que outra função terá nesse quadro o pobre PSDB senão o de uma força auxiliar do petismo moderado, função aliás já assumida, com humildade servil, também por todos os demais partidos? O PT, portanto, já ocupa todo o cenário político, sem deixar espaço para outra oposição que não sua própria oposição interna, vendendo como democracia o bom e velho “centralismo democrático” leninista. Quem quer que tenha estudado Lênin reconhece nesse processo a aplicação literal da “estratégia das tesouras”, coroada de sucesso fulminante graças à estupidez pomposa de tantas lideranças ilusoriamente antipetistas. Não é preciso dizer que, precisamente nesse ponto, os gaúchos foram a exceção honrosa, porque só no Rio Grande houve oposição efetiva, graças não só à coragem daquelas entidades combatentes mas à lucidez de tantos estudiosos e analistas políticos, entre os quais me ocorrem agora especialmente, sem demérito de quaisquer outros, os nomes de Denis Rosenfield, José Giusti Tavares, Adolpho João de Paula Couto e Percival Puggina.

Em terceiro lugar, é uma deplorável burrice confundir o discurso moderado com a moderação das ações. Afinal, Stalin começou sua carreira de governante, justamente, esmigalhando a ala extremista do Partido Comunista russo. E quem assinou em dezembro de 2001 o manifesto de solidariedade às Farc na reunião do Foro de São Paulo em Havana não foi nenhum “radical do PT”, e sim Luís Inácio da Silva em pessoa — a moderação encarnada. Quando um homem como o sr. Antonio Palocci é festejado nos meios empresariais graças ao poder encantatório do seu comedimento discursivo, todo mundo esquece que ele é um propagandista das Farc, cúmplice ideológico da morte de mais de 30 mil vítimas da narcoguerrilha colombiana. Num momento em que agentes das Farc estão reconhecidamente infiltrados nas quadrilhas nacionais de narcotraficantes, treinando bandidos para elevar o grau de violência nas nossas ruas até o absolutamente insuportável, prever a conduta de políticos esquerdistas mais pela moderação da sua fala do que pela periculosidade das suas alianças é mais que suicídio: é um namoro com o genocídio.

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