Olavo de Carvalho

16 de outubro de 2009

Esta semana, ganhou um prêmio de jornalismo o sr. Merval Pereira, cuja mais notável realização como articulista de O Globo tem consistido em repetir, sem citar-lhes a fonte, as informações sobre o Foro de São Paulo que forneci aos leitores daquele jornal desde a minha primeira coluna de 27 de maio de 2000 até à minha demissão em 2005. Informações que, tidas como muito exageradas e desagradáveis na ocasião, logo depois acabaram por se confirmar integralmente ao ponto de excitar, naquele e em outros membros da classe, a ânsia incontida de atribuir a si próprios, retroativamente, os méritos jornalísticos daquele em quem antes só viam deméritos.

Não cabe aqui falar de plágio, pois a lei brasileira define esta palavra como traslado literal apenas. Mas, que é um caso inequívoco de macaqueação retardada, é. Como no Brasil de hoje o que se chama de jornalismo é precisamente isso na melhor das hipóteses, devo admitir que a premiação do sr. Pereira tem a sua razão de ser. Creio mesmo que o comitê julgador que lhe concedeu essa honraria deve ter visto nele algum sinal de gênio, naquele sentido em que Albert Einstein dizia: “O segredo da genialidade, muitas vezes, consiste em ocultar as fontes.”

Plágio, no sentido oficial do termo, foi o que veio logo a seguir: o sr. Paulo Ghiraldelli, colunista do Estadão que por motivos insondáveis se autodenomina “o filósofo de São Paulo”, com ênfase no “o” (como se não fossem dessa cidade os quatro maiores filósofos que o Brasil já teve, Mário Ferreira dos Santos, Miguel Reale, Vicente Ferreira da Silva e Vilém Flusser), lançou na praça uma coleção de livros com título obscenamente copiado da minha “História Essencial da Filosofia”.

Esse cidadão é aquele mesmo que, contestando fosse de Platão uma afirmação de Platão por mim reproduzida em artigo de jornal, continuou insistindo na negativa mesmo depois que lhe exibi o original grego da frase tal como constava da edição Loeb Classics, cuja idoneidade filológica jamais foi posta em dúvida — de modo que me vi derrotado no debate por inépcia invencível do adversário, saindo dali humilhado e cabisbaixo, a meditar sobre o ensaio clássico de William Hazlitt, “As desvantagens da superioridade intelectual”.

Ele é também aquele mesmo que negou com veemência fosse dele o traseiro pelado e peludo exibido, num vídeo do Youtube, ao lado do corpo nu da sua digníssima, sem nos explicar jamais quem seria então o proprietário daquela porção glútea, nem muito menos a razão, se alguma houvesse, da presença desse misterioso personagem em tão íntima cena familiar.

Em vista desses seus arrebatamentos metafísicos contra a realidade das coisas, temo que ele venha a negar, com a mesma obstinada convicção, que o título “História Essencial da Filosofia” seja igual a “História Essencial da Filosofia”, infundindo destarte na minha alma as dúvidas mais atrozes quanto à existência do mundo exterior, à validade da lógica elementar ou à minha própria identidade pessoal. senão também à dele e à de tudo o mais.

Não ousarei, é claro, averiguar se nos seus livros ele copiou mais algum trecho do meu curso, pois para isso eu teria de ler a coisa inteira e tenho a certeza de que não sobreviveria a tão sublime experiência, sendo minha bolsa escrotal velha de 62 anos e já não tão elástica quanto em outros tempos.

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