Olavo de Carvalho

Zero Hora, 27 de novembro de 2005

O Prêmio Imbecil Coletivo, que instituí em 1995 e distribuí generosamente a escritores, professores, artistas e jornalistas brasileiros até 2001, foi suspenso no ano seguinte por excesso de concorrentes. Para fazer justiça seria preciso atribuí-lo ao conjunto dos intelectuais públicos deste país, o que só pode ser feito em intenção e não de corpo presente. O cobiçado galardão tornou-se então uma entidade metafísica, um a priori kantiano que precede a manifestação material das opiniões e já vem anexado à simples intenção de dizer o que quer que seja, mesmo quando não se chegue a dizer coisa alguma.

A comissão julgadora, constituída da minha pessoa, deu-se por derrotada ante a avalanche de panegíricos ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Proclamando a identidade absoluta de estupidez pessoal e sabedoria infusa, esses borbulhos de entusiasmo eleitoral transcendiam infinitamente o fenômeno descrito no meu livro, que pressupunha ao menos uma certa precaução de salvar as aparências. A partir do momento em que a ojeriza ao conhecimento foi assumida abertamente, o Imbecil Coletivo passou da potência ao ato e tornou-se o estado natural de toda a classe falante, não tendo mais motivo para ser premiado.

Contribuiu também para a minha decisão o desencanto, a mágoa profunda que se apossou da minha alma diante de tantas insinuações pérfidas de que eu havia recebido propinas do dr. Emir Sader para premiá-lo todos os anos. O próprio dr. Sader piorou formidavelmente a situação quando escreveu que eu não existia, o que foi interpretado pelos maliciosos como tentativa desesperada de camuflar o suborno negando a materialidade física do subornado.

Essas coisas acabam com o ânimo da gente. Um dia acordei com a pá virada e dei um fim no raio do Prêmio.

No entanto, nem tudo está perdido.

Extinto o certame, o vácuo na alma dos saudosos pode agora ser preenchido vantajosamente por um desses diplomas dos cursos especiais que a Universidade de São Paulo planeja dar aos membros do MST. A posse de um desses objetos tubulares, não totalmente desprovidos de sex appeal para senhoras carentes e gays solitários, dará ao seu portador, mesmo imune a esses encantos suplementares, as honras do título superior sem necessidade de exame escrito, tendo em vista o reconhecimento, por parte daquela instituição de ensino, do direito de todos ao analfabetismo doutoral, até aqui só reservado a uns poucos privilegiados como o sr. presidente da República e o seu ministro da – como era mesmo o nome daquilo? – Cultura.

É o equivalente perfeito do Prêmio, com a vantagem adicional de não ser conferido desde fora, por um palpiteiro leigo como eu, mas desde a origem, desde a raiz, desde a fonte e centro produtor do fenômeno em si, do qual o meu livro não deu senão uma imagem apagada, distante e evanescente como as sombras na caverna de Platão. Fora, névoas da imitação barata! Do fundo das brumas da ilusão já se ergue o Sol da estupidez genuína, que por fim vai brilhar para todos.

Alegrai-vos, pois, candidatos a intelectuais ativistas do Terceiro Mundo! Nada tendes a perder exceto a vergonha na cara, propriedade privada que, segundo o ideal socialista, já abolistes em pensamento há muito tempo.

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